A cidade do Salvador está situada na Bahia de Todos os Santos uma légua da barra para dentro, num alto, com o rosto ao poente, sobre o mar da mesma baía; a qual cidade foi murada e torreada em tempo do governador Tomé de Sousa, que a edificou, como atrás fica dito, cujos muros se vieram ao chão por serem de taipa e se não repararem nunca, no que se descuidaram os governadores, pelo que êles sabem, ou por se a cidade ir estendendo muito por fora dos muros; e, seja pelo que fôr, agora não há memória aonde eles estiveram. Terá esta cidade oitocentos vizinhos, pouco mais ou menos, e por fora dela, em todos os recôncavos da Bahia, haverá mais de dois mil vizinhos, dentre os quais e os da cidade, se pode ajuntar, quando cumprir, quinhentos homens de cavalo e mais de dois mil de pé, afora a gente dos navios que estão sempre no porto. Está no meio desta cidade uma honesta praça, em que se correm touros quando convém, na qual estão da banda do sul umas nobres casas, em que se agasalham os governadores, e da banda do norte tem as casas do negócio da Fazenda, alfândega e armazéns; e da parte de leste tem a casa da Câmara, cadeia e outras casas de moradores, com que fica esta praça em quadro e o pelourinho no meio dela, a qual, da banda do poente, está desabafada com grande vista sobre o mar; onde estão assentadas algumas peças de artilharia grossa, donde a terra vai muito a pique sobre o mar; ao longo do qual é tudo rochedo mui áspero; e desta mesma banda da praça, dos cantos dela, descem dois caminhos em voltas para a praia, um da banda do norte, que é serventia da fonte que se diz Pereira, e do desembarcadouro da gente dos navios; o caminho que está da parte do sul é serventia para Nossa Senhora da Conceição, aonde está o desembarcadouro geral das mercadorias, ao qual desembarcadouro vai ter outro caminho de carro, por onde se estas mercadorias e outras coisas que aqui se desembarcam levam em carros para a cidade. E tornando à praça, correndo dela para o norte, vai uma formosa rua de mercadores até a sé, no cabo da qual, da banda do mar, está situada a casa da Misericórdia e hospital, cuja igreja não é grande, mas mui bem acabada e ornamentada; e se esta casa não tem grandes oficinas e enfermarias, é por ser muito pobre e não ter nenhuma renda de Sua Majestade, nem de pessoas particulares, e sustenta-se de esmolas que lhe fazem os moradores da terra, que são muitas, mas são as necessidades mais, por a muita gente do mar e degradados que destes reinos vão muito pobres, os quais em suas necessidades não têm outro remédio que o que lhe esta casa dá, cujas esmolas importam cada ano três mil cruzados pouco mais ou menos, que se gastam com muita ordem na cura dos enfermos e remédio dos necessitados (por Gabriel Soares de Sousa, 1587).
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Imagem: Mapa de Salvador (1631), por João Teixeira Albernaz.
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