segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Quem?

Desconfio de que já contei esta história em crônica muito antiga, mas de forma incompleta. Agora, com a proximidade das eleições, acredito que ela deva ser relembrada. O escritor Álvaro Lins foi editorialista do “Correio da Manhã”, chefe da Casa Civil na Presidência de JK e embaixador em Portugal, onde, aliás, criou um caso internacional dando asilo a um adversário do regime salazarista. Muitos o consideram o crítico literário mais completo do Brasil. Sua entrada na Academia Brasileira de Letras foi uma noite memorável, pois chegou atrasado duas horas para a cerimônia.

Em Lisboa, ele decidiu visitar a Suíça, sendo ali recebido com todas as honras. Na manhã do seu primeiro dia em Genebra, depois de ler os jornais locais, deu um giro pela cidade em companhia de um funcionário do governo. Andou pelas ruas, de carro e a pé. Em dado momento, comentou: “Li nos jornais que hoje é dia de eleições gerais. Mas não estou vendo nenhum movimento especial, nenhuma fila, nenhum posto eleitora”. O funcionário explicou: “Senhor embaixador, hoje, realmente, é dia de eleições gerais, e elas estão se processando normalmente”.

“Mas como? Não vejo nenhum movimento… nenhuma fila… parece um dia qualquer. “Não precisamos de filas. Cada quarteirão tem uma urna em local determinado. O eleitor chega e deposita sua cédula. À meia-noite, as urnas são recolhidas e, no dia seguinte, o resultado é proclamado.”

Álvaro Lins ouviu, abaixou a cabeça, pensou um pouco e perguntou: “Mas digamos… um eleitor pode depositar na mesma urna ou em outras muitas cédulas de um só candidato, dez, vinte… cem… e aí como é que fica?” Foi a vez de o funcionário suíço ficar espantado: “Mas senhor embaixador, QUEM faria isso?” ( por Carlos Heitor Cony para Folha de S. Paulo, 30.09.10)
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Imagem: Anjo Palhaço, por DDi Arte.

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