segunda-feira, 30 de agosto de 2010

Despejo na orla: um balanço

Em nota emitida no último dia 25 de agosto, o Comando do Segundo Distrito Naval negou que a Marinha brasileira seja proprietária da área na qual estavam situadas as barracas de praia de Salvador demolidas pela Prefeitura na semana passada. No documento divulgado, a Marinha explica a diferença entre as expressões “terrenos da marinha” e “terrenos de marinha”, termos distintos cuja interpretação equivocada dos seus significados teria gerado a suposta ideia de que a Marinha seria dona das áreas nas regiões da Orla Atlântica (da Barra até a Praia do Flamengo) e da Baía de Todos os Santos (do Canta Galo até São Tomé de Paripe), onde ficavam as barracas.
“Terrenos de marinha, em cuja área estão instaladas as barracas, são as áreas situadas na costa marítima, em faixa de 33 metros medidos a partir da posição do preamar médio e são assim denominados em razão da sua proximidade com as águas salgadas. Não são da Marinha do Brasil no sentido de pertencerem ao Comando da Marinha, que não exerce controle patrimonial sobre os mesmos sendo tal tarefa atribuída à Secretaria do Patrimônio da União (SPU), tendo em vista que os terrenos de marinha são bens públicos de domínio da União”, esclarece a nota.

A Marinha também negou ter entrado com uma ação na Justiça exigindo reintegração de posse da área. Segundo a nota, “não há qualquer participação da Marinha do Brasil nas ações que estão levando à desocupação das áreas situadas nos terrenos de marinha”.

A operação de demolição das barracas de praia perpetrada pela Prefeitura de Salvador por meio da Superintendência de Controle e Ordenamento do Uso do Solo do Município (Sucom) atendeu a uma determinação do juiz Carlos D’Ávila, da 13ª Vara da Justiça Federal. O juiz baseou sua decisão no fato de as barracas estarem em área da União, sendo, portanto, patrimônios públicos.

Em entrevista o prefeito João Henrique comunicou que a demolição das barracas precisava ser cumprida porque se tratava de uma determinação da União. “Temos que cumprir, se não cumprirmos seremos presos”, disse. O prefeito também pediu aos barraqueiros para mudarem sua postura e criticou o advogado da Associação dos Barraqueiros de Praia de Salvador, Sr. João Maia, por sua intransigência. “Olha só no que deu a falta de diálogo. Deu que o juiz mandou destruir tudo de uma vez só”, afirmou o prefeito.

Ao rebater a crítica do prefeito, o Sr. João Maia disse que tentou por diversas vezes manter negociação com a prefeitura. Segundo ele, “o prefeito nunca recebia e quando recebia colocava um secretário diferente com uma posição distinta. O juiz disse que não aceitava o projeto de revitalização da prefeitura desde agosto do ano passado e o prefeito não fez nada de lá pra cá. O prefeito deu tiro no pé, está vendo a repercussão agora, porque ele achava que o povo ia apoiar ele. Agora quer colocar a culpa em mim”.

Já o governador Jacques Wagner, em campanha para reeleição, considerou a derrubada das barracas de praia como “espetáculo horripilante”. Segundo ele, a Prefeitura não soube conduzir o processo. “Faltou mediação e nunca fui convocado para essa conversa”, disse o candidato ao ser questionado sobre o motivo de o governo estadual não ter intermediado o conflito entre os barraqueiros e a prefeitura. “O episódio ficou cheio de heróis dizendo bravatas e acabamos na pior solução possível. Sempre acho melhor uma negociação do que uma sentença”, declarou.

Essa situação, esse jogo de empurra faz lembrar a música Despejo na Favela do Adoniram Barbosa, cuja letra é a seguinte: “Quando o oficial de justiça chegou lá na favela e, contra seu desejo, entregou pra seu Narciso um aviso, uma ordem de despejo assinada seu Doutor. Assim dizia a petição: dentro de dez dias quero a favela vazia e os barracos todos no chão! É uma ordem superior [...] Não tem nada não, seu doutor, não tem nada não. Amanhã mesmo vou deixar meu barracão [...] Pra mim não tem problema. Em qualquer canto me arrumo de qualquer jeito me ajeito. Depois, o que eu tenho é tão pouco, minha mudança é tão pequena que cabe no bolso de trás. Mas essa gente aí, hein? Como é que faz”? Espero que a União e a Prefeitura de Salvador saibam responder a essa questão, afinal famílias inteiras estão, neste momento, sem saber o que fazer para continuarem tocando em frente suas vidas. Não é desta maneira que se resolvem os problemas de uma grande cidade (Fontes: A Tarde, Correio, e Política Hoje).
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Imagem: Fernando Vivas/Agência A Tarde.

Um comentário:

Louise Galdino disse...

Nossa!
Leio sempre os seus posts..muito interessantes e informativos para nós que estamos longe da terrinha!
Mesmo em outro mundo sentimos muito pelo caminho que a nossa Salvador vem tomando, ainda mais por termos familiares ainda por aí! Esta notícia então me abalou demais pois eu amo o litoral de Salvador! Acho um absurdo que decisões como esta sejam tomadas sem o conhecimento e aprovação da população! Continue postando para que possa sempre acompanhar mesmo que de longe as notícias!
Parabéns!