terça-feira, 20 de outubro de 2009

Morrer: a possibilidade do impossível

Morrer. Verbo intransitivo que denota perda da vida, da existência. Nessa acepção, a morte é interpretada como falecimento, isto é, como um fenômeno que ocorre na ordem das coisas naturais. Sendo, então, um fato natural como todos os outros fatos naturais, a morte, vista a partir dessa perspectiva, não tem significado específico para o homem. Morre-se e ponto final. É assim com todo e qualquer ser vivente seja este um insignificante vírus ou protozoário ou o mais brilhante dos seres humanos. A morte iguala tudo e todos. Na prática, porém, não é o que se observa. A insistente característica humana de selecionar, segregar, separar e classificar persiste até no momento da morte. Basta caminharmos pelos cemitérios de qualquer cidade para percebermos que nem mesmo nestes lugares as pessoas se dão conta de que as diferenças entre os seres humanos são da ordem superficial das coisas. Não quero aqui negar as diferenças genotípicas, fenotípicas ou culturais. Seria no mínimo estúpido se assim fizesse. Mas tais diferenças servem apenas para distinguir os seres humanos de maneira superficial. Como já escreveu o Antoine de Saint-Exupéry em O pequeno príncipe, “o essencial é invisível aos olhos”. Entretanto, os olhos são cegos e seguem pela vida afora sem se aperceberem que, como definiu Heidegger, a morte é a “nulidade possível das possibilidades do homem e de toda forma do homem” (In: Possibilità e libertà). Mas os seres humanos preferem não enxergar esse fato, por acreditarem que a existência humana é a mais importante, a mais significativa de todo o universo. Sem a humanidade, o universo simplesmente deixa de existir. Por conta disso, erguem túmulos, jazigos e mausoléus suntuosos, porque ostentam fartura e imponentes, pois exibem uma arte intensa, grave e profundamente bela na esperança de apaziguar a angústia de seres finitos, tão relevantes como a mais reles barata (por Sílvio Benevides).
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Imagem: Cemitério do Campo Santo (Salvador-BA), por Sílvio Benevides.

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