terça-feira, 27 de outubro de 2009

Site reúne acervo de Prêmio Vladimir Herzog

Foi lançado oficialmente no último dia 24/10 o site com o conteúdo dos trabalhos vencedores dos prêmios Vladimir Herzog de Anistia e de Direitos Humanos desde a sua primeira edição, em 1979. O projeto foi elaborado pela Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República e pelo Centro de Informação da ONU para o Brasil em parceria com o Instituto Vladimir Herzog e o Sindicato dos Jornalistas do Estado de São Paulo.

O novo site vai possibilitar aos internautas, em especial jornalistas e estudantes, o acesso a todas as informações das reportagens premiadas ao longo dos últimos 30 anos de realização do Prêmio. O foi digitalizado e todo o acervo estará disponível para pesquisa. Esse material já pode ser consultado no endereço http://www.premiovladimirherzog.org.br/.

Ivo Herzog, explica que o novo portal tem um importante objetivo de preservar o acervo do Prêmio Vladimir Herzog. “Foi feito um trabalho exaustivo de pesquisa e conseguimos os arquivos completos de quase todos os trabalhos. Esse é um registro histórico e uma forma de preservar e democratizar todo o conteúdo já premiado”. Herzog acrescenta que ainda faltam 205 reportagens para serem digitalizadas. “São materiais cujos arquivos se perderam. Portanto, pedimos aos premiados que verifiquem o site e nos ajude a completá-lo” (Fonte: Instituto Vladimir Herzog).

O caso Vladimir Herzog – Em 19 de abril de 1976, deu entrada na Justiça Federal de São Paulo, sendo distribuída para a 7ª Vara Cível, uma ação declaratória intentada por Clarice Herzog e seus filhos Ivo e André, contra a União Federal, pleiteando que fosse declarada a responsabilidade da União pela prisão, torturas e morte do jornalista Vladimir Herzog, marido e pai dos autores.

A inicial relatou que Vladimir era brasileiro naturalizado, professor e jornalista da TV Cultura – Canal 2 e que na noite de 24 de outubro de 1975 compareceu às dependências do DOI/CODI do II Exército, por solicitação de seus agentes, a fim de prestar esclarecimentos.

Fizeram-no apresentar-se no dia seguinte, à Rua Tomás Carvalhal, 1.030, na capital paulista. No final da tarde do mesmo dia, o Comando do II Exército fez distribuir nota na qual comunicava a morte de Vladimir Herzog, e entre outras inverdades dizia que o jornalista “admitiu exercer atividades no PCB; que, por volta das 15 horas, deixado, sozinho, em uma sala, redigiu declaração dando conta de sua militância no Partido Comunista; que, aproximadamente, às 16 horas, ao ser procurado na sala onde ficara, foi encontrado morto, enforcado em uma tira de pano”.

A nota afirmava que, solicitada a perícia, pelo técnicos foi constatada a ocorrência de suicídio e que “o cadáver de Vladimir Herzog foi encontrado, junto à janela, em suspensão incompleta e sustido pelo pescoço, através de uma cinta de tecido verde” e que “o traje que vestia o cadáver compunha-se de um macacão verde de tecido igual ao da referida cinta”. O fato provocou a maior repercussão em todo o país.

Em 30 de outubro de 1975, o general-comandante do II Exército instaurou inquérito policial para apurar as circunstâncias em que ocorreu o “suicídio” do jornalista Vladimir Herzog, que concluiu, como era esperado, pela ocorrência de suicídio.

Ocorre que Rodolfo Konder compareceu, espontaneamente, no dia 7 de novembro de 1975, às 16 horas ao escritório de advocacia dos drs. José Carlos Dias, Maria Luiza Flores da Cunha Bierrembach, José Roberto Leal de Carvalho e Arnaldo Malheiros Filho, no centro de São Paulo, e ali, na presença dos referidos advogados e, mais ainda, do dr. Prudente de Moraes, neto, do prof. Gofredo da Silva Telles Jr., do dr. Hélio Pereira Bicudo e do padre Olivo Caetano Zolin, prestou declarações que esclareceram a morte de Vladimir Herzog.

“Às seis horas da manhã do dia 24 de outubro do corrente, tocaram a campanhia de minha casa, e, quando fui atender, vi que eram três agentes da Polícia, os quais me disseram que eu deveria acompanhá-los para prestar alguns esclarecimentos. Fui levado numa caminhonete até as dependências do DOI, na rua Tomás Carvalhal, 1.030, endereço este que vim a conhecer posteriormente. Na estrada colocaram-me um capuz de pano preto na cabeça e me levaram para o interior do DOI. Lá dentro me fizeram tirar a roupa e me deram um macacão do Exército, e eu fiquei sentado num banco com o macacão e o capuz. Fiquei cerca de uma hora esperando, tempo que eu não posso calcular com certeza por terem me tirado o relógio, e fui chamado para o interrogatório. Fui levado para o primeiro andar, pois estava no térreo, e alguém começou a me fazer perguntas sobre minhas atividades políticas. Esta pessoa eu não posso identificar porque eu estava com o capuz na cabeça. Ela começou a se exasperar e me fazer ameaças, porque não estava satisfeita com as respostas que eu dava, e chamou umas duas pessoas para a sala de interrogatório, pediu a uma delas que trouxesse a “pimentinha”, que é uma máquina de choques elétricos e, a partir daí, eu comecei a ser torturado. Uma pessoa que mais tarde pela voz eu identifiquei como o chefe da equipe, e era forte, barrigudo, moreno, de cara rasgada. Este homem que batia com as mãos e gritava que ele era um anormal, o que eu achei muito estranho. Depois instalaram nas minhas mãos, amarrando no polegar e no indicador as pontas de fios elétricos ligados a essa máquina; a ligação era nas duas mãos e também nos tornozelos. Obrigaram-me a tirar os sapatos para que os choques fossem mais violentos. Enquanto o interrogador girava a manivela, o terceiro membro da equipe, com a ponta de um fio, me dava choques no rosto, por cima do capuz e, às vezes, na orelha, para isso levantando um pouco o capuz, para que o fio alcançasse a orelha. Para se ter uma idéia de como os choques eram violentos, vale a pena registrar o fato de que eu não pude me controlar e defequei, e, freqüentemente, perdia a respiração. (...)

No sábado de manhã, percebi que Vladimir Herzog tinha chegado. Como o capuz é solto, por baixo dele, quando a vigilância não é severa, pode-se ver os pés das pessoas que estão perto. Ao meu lado estava sentado George Duque Estrada, o Estado de S. Paulo, e eu comentei com ele que Vladimir Herzog estava ali presente, isto porque Vladimir Herzog era muito meu amigo e nós comprávamos sapatos juntos, e eu o reconheci pelos sapatos. Algum tempo depois, Vladimir foi retirado da sala. Nós continuamos sentados lá no banco, até que veio um dos interrogadores, levou a mim e ao Duque Estrada a uma sala de interrogatório no andar térreo, junto à sala em que nós nos encontrávamos. Vladimir estava lá, sentado numa cadeira, com o capuz enfiado e já de macacão. Assim que entramos na sala, o interrogador mandou que tirássemos os capuzes, por isso que nós vimos que era Vladimir, e vimos também o interrogador, que era um homem de 33 a 35 anos, com mais ou menos 1,75 metro de altura, uns 65 quilos, magro, mas musculoso, cabelo castanho-claro, olhos castanhos apertados e uma tatuagem de uma âncora na parte interna do antebraço esquerdo, cobrindo praticamente todo o antebraço. Ele nos pediu que disséssemos ao Vladimir ‘que não adiantava sonegar informações’. Tanto eu como Duque Estrada, de fato, aconselhamos Vladimir a dizer o que sabia, inclusive porque as informações que os interrogadores desejavam ver confirmadas já tinham sido dadas por pessoas presas antes de nós. Vladimir disse que não sabia de nada e nós dois fomos retirados da sala e levados de volta ao banco de madeira onde nos encontrávamos, na sala contígua. De lá, podíamos ouvir nitidamente os gritos, primeiro do interrogador e depois de Vladimir e ouvimos quando o interrogador pediu que lhe trouxessem a “pimentinha” e solicitou ajuda de uma equipe de torturadores. Alguém ligou o rádio, e os gritos de Vladimir se confundiam com o som do rádio. Lembro-me bem que durante esta fase o rádio dava a notícia de que Franco havia recebido a extrema-unção, e o fato me ficou gravado, pois naquele mesmo momento Vladimir estava sendo torturado e gritava. A partir de determinado momento, a voz de Vladimir se modificou, como se tivessem introduzido alguma coisa em sua boca; sua voz ficou abafada, como se lhe tivessem posto uma mordaça. Mais tarde os ruídos cessaram. Depois do almoço, não sei exatamente a que horas, o mesmo interrogador veio me perguntar sobre uma reunião política na minha casa, realizada em 1972, com a presença de um homem de cabelos grisalhos. Eu não me lembrava dessa pessoa, embora me lembrasse de um único encontro realizado em minha casa naquele ano, com a presença de uma outra pessoa, esta de cabelos escuros. O interrogador saiu novamente da sala e dali a pouco voltou para me apanhar pelo braço e me levar até a sala onde se encontrava Vladimir, permitindo mais uma vez que eu tirasse o capuz. Vladimir estava sentado na mesma cadeira, com o capuz enfiado na cabeça, mas agora me parecia particularmente nervoso, as mãos tremiam muito e a voz era débil.”

“Que o declarante, da mesma forma que todos os outros presos que teve oportunidade de ver nas dependências do DOI, foi deixado apenas com o macacão, o capuz e os sapatos, sendo que das pessoas que usavam sapatos com cordão para amarrar os cordões eram retirados, não ficando nenhum instrumento que pudesse ser usado contra a vida.”
“Que quando iniciou-se a tortura de Vladimir o declarante, estando na sala ao lado, chegou a ouvir sons de pancadas que lhe eram desferidas.”

Vladimir Herzog foi cruelmente torturado, e, depois disso, redigiu a declaração que o comprometia com agremiação política ilegal. O fato de haver rasgado o papel comprova que repudiou totalmente a suposta confissão, obtida mediante métodos violentos. Ademais, não poderia ter se suicidado com o cinto do macacão, pois, segundo Rodolfo Osvaldo Konder, “o macacão que lhe deram para vestir nas dependências do DOI, a exemplo de todos os outros, não tinha cinto” (Fonte OAB – Seção de São Paulo).
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Imagem: acervo do InstitutoVladimir Herzog

Campanha de combate ao câncer de pênis

Não lavar o pênis diariamente pode causar muitas doenças. Entre a cabeça do pênis (glande) e a pele (prepúcio) é produzida uma gordura, ou sebo, branco, chamado esmegma que deve ser limpo todos os dias, pois pode causar mau cheiro e facilitar o aparecimento de doenças e infecções. Uma das doenças que pode aparecer é o câncer no pênis. É verdade, não lavar o pênis pode causar um tumor maligno muito agressivo e que muitas vezes é necessário cortar fora parte ou o pênis inteiramente. No Brasil, anualmente, 1.000 homens perdem seu órgão sexual por causa disso.

A estimativa da Sociedade Brasileira de Urologia (SBU) é que mais de três mil homens tenham a doença, que pode ser evitada de maneira muito simples: higiene genital adequada. Lavar o pênis é muito simples e deve ser feito todos os dias. Lave com água e sabão e não esqueça de puxar a pele para trás para lavar a cabeça do pênis (glande).

O câncer de pênis é uma doença que mutila o homem, tanto na parte física, quanto na alma. São mil amputações por ano no país. Apesar disso, é um dos cânceres mais evitáveis que existe no mundo. É associado à falta de higiene na área genital”, esclareceu o médico Aguinaldo Nardi, coordenador de campanhas públicas da SBU.

De acordo com dados levantados pela SBU o estado de São Paulo, maior população do país, com 40 milhões de habitantes, é o que também concentra o maior índice de casos: 24,26%. Em seguida, vem o Ceará, com 12,87%, Maranhão com 10,66% e Rio de Janeiro, com 9,19%. A Bahia ocupa o 12º lugar no ranking com 1,10% dos casos. O que mais assusta os profissionais da SBU não é ter São Paulo, com mais de 40 milhões de habitantes em primeiro lugar, mas sim ter Ceará e Maranhão, que juntos têm um pouco mais de 1/4 dos paulistanos, em segundo e terceiro lugares.

Se olharmos as estatísticas, veremos que, em números, São Paulo está em primeiro lugar, mas quando se verifica a naturalidade dessas pessoas, curiosamente percebemos que a maior parte delas vem de cidades do interior do Maranhão, Ceará, Pernambuco, Bahia, Pará e Minas Gerais”, diz o presidente da SBU, Dr. Sidney Glina.

Dados levantados pelo Data/SUS nos últimos cinco anos ratificam a pesquisa da SBU ao mostrar que a amputação do órgão – medida tomada quando a doença é grave – tem aumentado cerca de 10% ao ano. Este número leva a entidade a acreditar que o país esteja em segundo lugar no ranking mundial da doença, atrás apenas da Índia, país com a maior incidência mundial, com taxas de 3,32 casos a cada 100 mil habitantes

Sempre que você notar qualquer coisa diferente no seu pênis, uma ferida ou ferimentos que não cicatrizam mesmo após tratamento médico; caroços que não desaparecem, mesmo após tratamento, e que apresentam secreções e mau cheiro; vermelhidão ou coceira duradoura na cabeça do pênis (glande), especialmente nos homens cuja pele do pênis (prepúcio) é excessiva, a popular fimose; manchas esbranquiçadas ou perda de pigmentação em áreas do pênis; surgimento de tumores no pênis ou na virilha (íngua); uma bolha qualquer, corrimento ou tiver ardor na hora de urinar, procure logo um médico e não faça sexo até ter certeza que não tenha a doença. Não use pomadas ou remédios caseiros. Vá ao médico mesmo que a ferida desapareça sozinha. Não tenha medo, pois se for descoberto no começo, o câncer de pênis pode ser facilmente tratado e as chances de cura do paciente são bem grandes.

Doenças venéreas ou sexualmente transmitidas, que são pegas quando se faz sexo aumentam a chance de se ter um tumor. Por isto use camisinha quando fizer sexo com muitas parceiras ou muitos parceiros. Não é difícil evitar essas doenças. É só usar camisinha nas relações sexuais e no caso do câncer de pênis, lavar com água e bastante sabão diariamente! (Fonte: Sociedade Brasileira de Urologia)
VÍDEO DA CAMPANHA
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Imagem: Cartaz da campanha promovida pela SBU

terça-feira, 20 de outubro de 2009

Morrer: a possibilidade do impossível

Morrer. Verbo intransitivo que denota perda da vida, da existência. Nessa acepção, a morte é interpretada como falecimento, isto é, como um fenômeno que ocorre na ordem das coisas naturais. Sendo, então, um fato natural como todos os outros fatos naturais, a morte, vista a partir dessa perspectiva, não tem significado específico para o homem. Morre-se e ponto final. É assim com todo e qualquer ser vivente seja este um insignificante vírus ou protozoário ou o mais brilhante dos seres humanos. A morte iguala tudo e todos. Na prática, porém, não é o que se observa. A insistente característica humana de selecionar, segregar, separar e classificar persiste até no momento da morte. Basta caminharmos pelos cemitérios de qualquer cidade para percebermos que nem mesmo nestes lugares as pessoas se dão conta de que as diferenças entre os seres humanos são da ordem superficial das coisas. Não quero aqui negar as diferenças genotípicas, fenotípicas ou culturais. Seria no mínimo estúpido se assim fizesse. Mas tais diferenças servem apenas para distinguir os seres humanos de maneira superficial. Como já escreveu o Antoine de Saint-Exupéry em O pequeno príncipe, “o essencial é invisível aos olhos”. Entretanto, os olhos são cegos e seguem pela vida afora sem se aperceberem que, como definiu Heidegger, a morte é a “nulidade possível das possibilidades do homem e de toda forma do homem” (In: Possibilità e libertà). Mas os seres humanos preferem não enxergar esse fato, por acreditarem que a existência humana é a mais importante, a mais significativa de todo o universo. Sem a humanidade, o universo simplesmente deixa de existir. Por conta disso, erguem túmulos, jazigos e mausoléus suntuosos, porque ostentam fartura e imponentes, pois exibem uma arte intensa, grave e profundamente bela na esperança de apaziguar a angústia de seres finitos, tão relevantes como a mais reles barata (por Sílvio Benevides).
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Imagem: Cemitério do Campo Santo (Salvador-BA), por Sílvio Benevides.

Acreditar é possível?

Dizer que nossas instituições políticas estão a enfrentar uma séria crise de credibilidade já não é novidade para ninguém. Inúmeros estudos e pesquisas confirmam essa idéia. Dizer também que essa crise é sem razão não faz o menor sentido. Nossos políticos profissionais nos dão motivos de sobra para não confiarmos em suas ações e intenções nem de olhos escancarados. Entretanto, nem tudo é um mar de mistura pastosa de argila e água no mundo da política. Certas iniciativas no âmbito das instituições políticas merecem todo nosso elogio. Uma dessas iniciativas é a Escola do Legislativo da Assembléia Legislativa do Estado da Bahia.

A Escola do Legislativo desenvolve ações que, segundo sua diretora, têm o objetivo de educar para a cidadania. Essa iniciativa é muito importante porque não se nasce cidadão, aprende-se a sê-lo. E esse processo de aprendizagem envolve desde o conhecimento da nossa história até o funcionamento das instituições políticas, como a Assembléia Legislativa, por exemplo. Somente através da educação podemos conhecer nossos direitos e deveres. Daí a importância desse tipo de ação promovida pela Escola do Legislativo, que na última quarta-feira (14/10) recebeu a visita de um grupo de estudantes de Comunicação Social e Fisioterapia da UNIJORGE.

A Assembléia Legislativa da Bahia tem 63 deputados que representam os interesses da população dos 417 municípios do Estado. Os parlamentares são as personagens centrais do Poder Legislativo cujas principais funções podem ser resumidas a quatro. A primeira dessas funções é, obviamente, legislar, ou seja, formular e estabelecer leis, regras e princípios norteadores da vida em comunidade. A segunda função é fiscalizar o Poder Executivo (o Legislativo é fiscalizado pelo Ministério Público). A terceira função do Legislativo é julgar crimes de responsabilidade, aqueles praticados por quem é responsável pela administração do dinheiro público. Por fim, o Legislativo tem por função representar o cidadão. Aqui se encontra o maior problema. Que cidadão se sente, de fato, representado por seus deputados e/ou senadores? Se existe algum, este, certamente, se constitui numa exceção que, como toda e qualquer exceção, reforça a regra, que, via de regra, nos leva a desacreditar cada vez mais em nossos representantes.

Mas qual a razão de tanta descrença? Poderia citar aqui infinitas razões. Porém, creio que a principal delas diz respeito à falta de reciprocidade. Explico-me. De acordo com dados fornecidos pela própria Escola do Legislativo, cada parlamentar da Câmara Federal custa, em média, para os contribuintes brasileiros cerca de 5 milhões de dólares ao ano, entre salário, verba de gabinete, passagens aéreas e outras vantagens previstas em lei. Comparando com outros países, podemos ter uma idéia se este valor é alto ou não. Na Argentina, nosso vizinho, os custos que um parlamentar gera aos cofres públicos não vão além dos 600 mil dólares. Na Espanha, país da União Européia que mais gasta com os representantes do povo, os custos não ultrapassam 1 milhão de dólares. No âmbito estadual os custos com os parlamentares não são tão vultosos. Cada parlamentar custa, em média, aos contribuintes baianos a módica quantia de 1 milhão de reais por ano, incluindo todo tipo de despesa. Esses dados chamam atenção não apenas pelos números, mas, também, pelo fato de que todo esse investimento não se reverte em uma contrapartida satisfatória para o cidadão. Sabemos da importância do Legislativo na ordem democrática, mas por qual motivo ele nos custa tão caro? Outros atores sociais são igualmente importantes para a democracia e para a sociedade como um todo e não custam tão caro para os cofres públicos, como é o caso dos professores, por exemplo.

O legislativo pode ser considerado tão ou mais moroso que a justiça. A sociedade muda com uma velocidade que nossos parlamentares não conseguem acompanhar. Nossos representantes, constantemente, estão envolvidos em escândalos de corrupção e abuso de autoridade cada vez mais escabrosos e por aí vai. Durante a visita à Assembléia Legislativa da Bahia, por exemplo, o grupo de estudantes da UNIJORGE teve a oportunidade de assistir a uma sessão plenária, na qual se debatiam os resultados da gestão do governador Jacques Wagner, gestão esta com quase três anos, segundo a oposição, e com pouco mais de dois anos, de acordo com os aliados. O painel eletrônico da Câmara marcava 53 deputados presentes e 10 ausentes. Porém, via-se, apenas, 10 deputados reunidos no plenário. Estes, entre outras coisas, liam jornal, falavam ao celular, conversavam animadamente com o colega sentado ao lado ou atrás, enquanto um dos companheiros discursava. É claro que os parlamentares presentes no painel, mas ausentes na plenária, poderiam estar na casa executando outras atividades. Entretanto, diante das circunstâncias em que se encontra o Poder Legislativo no imaginário da população, fica difícil acreditar no que se pode ver e mais difícil, ainda, naquilo que não se vê (por Sílvio Benevides).
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Imagem: Estudantes em visita a Assembléia Legislatva por Sílvio Benevides.

segunda-feira, 12 de outubro de 2009

Sábado à noite na cidade do Salvador da Bahia - Brasil

Sábado à noite na cidade do Salvador da Bahia. A iminência de chuva forte levou um grupo de amigos a celebrar a vida no interior de um Boteco, localizado em um beco qualquer do Rio Vermelho. Entre um gole e outro e conversas sobre lâminas de menta e suas conseqüências afrodionisíacas, o calor foi aumentando, o suor molhando as frontes e a necessidade de bebidas geladas crescendo e a todos absorvendo. O que poderia ter acontecido? Indagavam-se todos. O ar-condicionado por certo pifou, diriam os mais incautos. Mas não foi nada disso. A causa de tanto calor encontrava-se na mesa ao lado. Dois casais que nela estavam simplesmente tinham desligado o aparelho porque sentiam frio. Como assim? Se eles estavam com frio, por que foram se abancar justamente na ala do Boteco destinada àqueles que preferem papear num ambiente climatizado? Absurdo dos absurdos! Os arrogantes fregueses desligaram o ar-condicionado sem sequer consultar os demais clientes. Eles sentiam frio e isso lhes bastou. A opinião dos outros ali presentes não importava. E para tornar a situação mais absurda do que já era, quando se reclamou daquela situação, os quatro indivíduos se sentiram ofendidos. Sem argumentos para justificar tamanha arrogância e prepotência, o líder do quarteto de idiotas, que nas horas vagas brincava de ser tenor desentoado, resolveu apelar para palavras de baixíssimo calão. Como ninguém se intimidou, os quatro saíram a bufar sua ignóbil ignorância em busca de outra mesa, onde pudessem exercer sua arrogância sem serem importunados. No Brasil as coisas costumam funcionar assim: as regras existem, mas tão somente para os outros. Se me oponho a isso, corro o risco de receber nome de chato, mal-amado, mal-resolvido, quem sabe mesmo um tiro e por aí vai. De uma maneira geral, o brasileiro tem muita dificuldade para se submeter às regras, que existem, não para atrapalhar, mas, sim, para facilitar a vida em comunidade. Sem regras não há como viver em sociedade. Elas são o alicerce sobre o qual se constrói o respeito, fundamental para se estabelecer qualquer tipo de relação ou relacionamento, seja entre indivíduos, seja entre nações (por Sílvio Benevides).
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Imagem: "O Grito", Edward Munch, 1893.

Antigamente era assim...

A nota abaixo é uma sentença do dia 15 de outubro e 1833 dada pelo Juiz de Direito de Folha de Sergipe. Revela-nos como o crime de estupro era tratado pelas autoridades no Brasil d'antanho.

PROVÍNCIA DE SERGIPE
O adjunto de promotor público, representando contra o cabra Manoel Duda, porque no dia 11 do mês de Nossa Senhora Sant’Ana, quando a mulher do Xico Bento, ia para a fonte, já perto dela, o supracitado cabra que estava de em uma moita de mato, sahiu della de supetão e fez proposta a dita mulher, por quem queria para coisa que não se pode trazer a lume, e como Ella se recusasse, deitou-a no chão, deixando as encomendas della de fora e ao Deus dará. Elle não conseguiu matrimônio porque Ella gritou e veio em amparo della Nocreto Correia e Norberto Barbosa, que prenderam o cujo em flagrante. Dizem a leises que duas testemunhas que assistam a qualquer naufrágio do sucesso faz prova.

CONSIDERO:
QUE o cabra Manoel Duda agrediu a mulher de Xico Bento para conxambrar com ela e fazer chumbregâncias, coisas que só marido della competia conxambrar, porque casados pelo regime da Santa Igreja Cathólica Romana;
QUE o cabra Manoel Duda é um suplicante debochado que nunca soube respeitar as famílias de suas vizinhas, tanto que quis também fazer conxambranas com a Quitéria e Clarinha, moças donzellas;
QUE Manoel Duda é um sujeito perigoso e que não tiver uma cousa que atenue a perigança dele está metendo medo até nos homens.

CONDENO:
O cabra Manoel Duda, pelo malefício que fez à mulher do Xico Bento, a ser CAPADO, capadura que deverá ser feita a MACETE. A execução desta peça deverá ser feita na cadeia desta Villa.
Nomeio carrasco o carcereiro.
Cumpra-se e apregue-se editais em lugares públicos.

Manoel Fernandes dos Santos
Juiz de Direito da Vila de Porto da Folha de Sergipe, 15 de Outubro de 1833.
(Fonte: Instituto Histórico de Alagoas)
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Imagem: "Negra tatuada vendendo caju", Jean-Baptiste Debret, 1827.

domingo, 4 de outubro de 2009

Poema Falado - Oração pela Paz

Oração – “Oh Senhor, faze de mim um instrumento da tua paz: / Onde há ódio, faze que eu leve Amor; / Onde há ofensa, faze que eu leve Perdão; / Onde há discórdia, que eu leve União; / Onde há dúvida, que eu leve a Fé; / Onde há erro, que eu leve a Verdade; / Onde há desespero, que eu leve a Esperança; / Onde há tristeza, que eu leve a Alegria; / Onde há trevas, que eu leve a luz. / Oh Mestre, faze que eu procure menos / Ser consolado do que consolar; / Ser compreendido do que compreender; / Ser amado do que amar. / Porquanto é dando que se recebe; / É perdoando que se é perdoado; / É morrendo que se ressuscita para a Vida Eterna” (tradução de Manuel Bandeira).

SÃO FRANCISCO VIVE AINDA ENTRE NÓS - São Francisco de Assis (1181-1226) é venerado em todo o mundo como uma das figuras das quais mais nos orgulhamos. Na sua biografia se tornaram visíveis e possíveis sonhos carregados ao longo de toda a vida e acalentados no fundo de nosso coração: uma relação amorosa e terna com Deus, Pai e Mãe de infinita bondade, um amor simples a todas as coisas, vivenciadas como irmãos e irmãs; uma discreta reconciliação entre os impulsos do coração e as exigências do pensamento, feitos próximos, e dos próximos feitos irmãos; uma aceitação jovial daquilo que não podemos mudar; uma inocente liberdade em face das ordens e regras estabelecidas; uma alegra acolhida da morte como amiga da vida.

São Francisco inundou a esfera humana de espírito de benquerença, fraternura e paz, que continuou a ressoar com o passar dos tempos até nossos dias. Em sua homenagem igrejas, cidades, escolas, rios, instituições e pessoas carregam o nome de São Francisco.

Mais ainda: há comportamentos, símbolos, idéias e sonhos que reportam naturalmente a São Francisco como se ele próprio fosse seu autor. E isso não sem razão, porque ele continua a viver como arquétipo nas mentes e nos corações das pessoas e de muitos movimentos culturais, na não-violência, na fraternidade universal, na jovialidade, no amor aos animais e na ecologia, expressões importantes da busca espiritual da cultura de nossa época.

Existe uma espiritualidade franciscana difusa no espírito de nosso tempo, nascida da experiência de Francisco, de Clara e de seus primeiros companheiros. Trata-se do caminho da simplicidade, da descoberta de Deus na natureza, do amor singelo a todas as criaturas, da confiança quase infantil na bondade das pessoas e na imperturbável alegria, mesmo em face dos dramas mais pungentes da vida humana.

A Oração pela Paz também chamada de Oração de São Francisco constitui uma das cristalizações desta espiritualidade difusa. Ela não provém diretamente da pena do Francisco histórico, mas da espiritualidade do São Francisco da fé. Ele é seu pai espiritual e por isso seu autor no sentido mais profundo e abrangente desta palavra. Sem ele, com certeza, essa Oração pela Paz jamais teria sido formulada nem divulgada e muito menos teria se imposto como uma das orações mais ecumênicas hoje existentes. Ela é rezada por fiéis de todos os credos e por professantes de todos os caminhos espirituais.

Ela tem o condão de unir a todos num mesmo espírito de paz e de amor. Por um momento faz sentir que todos somos de fato irmãos e irmãs na grande família humana e cósmica e também filhos e filhas da família divina.

Vamos aprofundar o teor dessa Oração pela Paz para revelar sua riqueza insuspeitada e para despertar o Francisco e a Clara que dormem dentro de cada um de nós (por Leonardo Boff).
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Referências:

BANDEIRA, Manuel. Meus poemas preferidos. São Paulo: Ediouro, 2002.

BOFF, Leonardo. A Oração de São Francisco: uma mensagem de paz para o mundo atual. Rio de Janeiro: Sextante, 1999.
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POEMA FALADO – ORAÇÃO PELA PAZ



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Imagem: Francisco de Zurbaran – São Francisco (1660)