terça-feira, 30 de dezembro de 2008

Ano novo?

Estamos ainda a viver momentos de confraternização. Em Salvador, assim como em muitas partes do mundo, o tom dos discursos é o de boas vindas, boas festas, boas novas. As luzes natalinas espalhadas pela cidade acendem a esperança de que 2009 será melhor que 2008. Será? As notícias que chegam até nós são um tanto desalentadoras. Vejamos algumas manchetes:
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HOMEM MATA ENTEADA E ESFAQUEIA A MULHER (A Tarde Online - 25/12/2008)
FERIADÃO JÁ SOMA 20 HOMICÍDIOS NA GRANDE SALVADOR (A Tarde Online - 26/12/2008)
PREFEITURA AUTORIZA REAJUSTE DA TARIFA DE ÔNIBUS PARA R$ 2,20 (Correio da Bahia - 29/12/2008)
JOVEM É MORTA A FACADAS PELO EX-MARIDO EM ÁGUAS CLARAS (Correio da Bahia - 29/12/2008)
VENDEDOR AMBULANTE É ENCONTRADO MORTO NO TÚNEL AMÉRICO SIMAS (Correio da Bahia - 29/12/2008)
TRAFICANTE ATEIA FOGO EM CINCO PESSOAS EM FEIRA DE SANTANA (A Tarde Online - 27/12/2008)
PARA PAPA, EVITAR COMPORTAMENTO GAY É COMO SALVAR FLORESTAS (O Dia Online - 23/12/2008)
ENCONTRADOS OITO CADÁVERES EM SACOS DE LIXO NO MÉXICO (Correio Braziliense - 24/12/2008)
APÓS TRÊS DIAS DE BOMBARDEIOS DE ISRAEL, MORTOS PASSAM DE 360 NA FAIXA DE GAZA (UOL Notícias - 29/12/2008)
MINISTRO DIZ QUE ISRAEL VAI “ATÉ O FIM” EM GUERRA CONTRA HAMAS (BBC Brasil - 30/12/2008)
ISRAEL DECLARA-SE EM “GUERRA ABERTA” E INSTALA CERCO MILITAR (Estadão - 30/12/2008)
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Renovar é preciso. Porém, de nada adianta trocar o calendário da parede ou a agenda velha por uma novinha em folha, ou ainda, orar com a melhor das intenções (sabemos bem onde fica um lugar cheio de boas intenções). Renovar vai mais além, pois significa alterar para melhor. Mas alterar o quê? O primeiro passo talvez seja alterar nossas consciências, como nos lembra o Fernando Pessoa em seu poema abaixo reproduzido.
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Passaram-se os dias de festa
E o que resta do espírito natalino...

O menino Jesus volta a crescer mendigo
Sem amigos que o entendam, provavelmente...
Sai do berço e volta à cruz gemente,
estranho e distante.

Passou o Natal...
Passou o Ano Novo...

E o encanto dos presentes fica por conta
Da confraternização...
O pobre sentiu-se feliz,
O rico sentiu-se humano
(e todos se enganaram novamente)

É o novo calendário...
É a fantasia!
Mas não muda a realidade
Não muda a crueldade
Não muda a bondade...
Os homens são os mesmos
Os seres são os mesmos
Os pobres são os mesmos
Os ricos são os mesmos
(o governo é o mesmo)

Resta, desconhecida, a energia da Fonte,
Resta, desconhecido, o calor e o brilho da luz:
O Espírito está Vivo mas, resta desconhecido!
E a sua força do bem querer
E a sua força do bom ânimo que se irradia...

E a força humana desta divina alma humana
Ainda exala perfume e poesia...

Passaram-se as festas:
O Natal, o Ano Novo, o engano!

Mas, resta ainda algo de bom em nós...
Resta uma pequena brasa de calor humano
Resta um pirilampo de sinceridade
(alguma coisa que não seja engano)

Quem sabe não seja a consciência
De que após o Natal houve festa de demônios
Festejando as almas das crianças de Herodes?
(festejando as almas das crianças de Nicolau?)
Que houve fuga, e solidão, e tristeza...

Que o menino cresceu no tédio de calar-se sempre,
De distanciar-se sempre, de chorar sempre...
...ao ver a pobreza, e a miséria sempre,
E a maldade sempre, e a angústia sempre...
E ainda ir só à cruz, e só tornar-se um estranho "Cristo",
Oscilando entre uma manjedoura de plástico e uma cruz romana...

Onde está o filho de Mirian?
Onde está o jovem barmitzvá?
Onde está o mestre, o rabi e o profeta?
-perdido entre os fios de barba branca e plástica...
-perdido e entregue à cruz pelos seus algozes, perpetuamente...

Quem sabe, não seja a necessidade e o acaso?
Quem sabe, não seja o tempo e o espaço?
...e, sem razão, gritos que atravessam a noite?

Quem sabe não seja a consciência
De que nada podemos esperar de novo
Senão de nós mesmos, e das nossas mãos,
E dos nossos atos, e da nossa alma...
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Com essa reflexão o Salvador na sola do pé se despede de 2008, esperando que ao final de 2009 as manchetes nos tragam realmente boas novas, repletas de ventos renovadores (por Sílvio Benevides).
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Foto: Sílvio Benevides

Podres Poderes

O mundo a explodir por conta da violência e da intolerância e o papa Bento XVI a propagar a crença de que homens e mulheres homossexuais e transexuais ameaçam o planeta e a humanidade. Em seu pronunciamento de final de ano para clérigos do Vaticano, declarou que a chamada “ordem da criação” deve ser respeitada, insinuando que aqueles cujo comportamento foge aos padrões heterosexistas não a respeitam como mostra a nota abaixo, extraída do jornal Último Segundo/BBC Brasil do dia 23/12/2008:
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Segundo ele, não é “metafísica anacrônica” se referir à “natureza humana como ‘masculina’ ou ‘feminina’”. Isso teria se originado na “linguagem da criação, que, se desprezada, significaria a autodestruição dos humanos”. E acrescentou: “Florestas tropicais merecem, sim, nossa proteção, mas o ser humano... não merece menos que isso”.
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Seria até cômico, se não fosse deveras estúpido e por isso mesmo patético! Nada mais anticristão do que fomentar o ódio e a intolerância. Declarações assim em nada contribuem para difundir o maior legado que Cristo nos deixou: o legado do amor. Enquanto o papa exerce seus podres poderes, homens e mulheres homossexuais, travestis e transexuais são assassinados em nome do equilíbrio ecológico, como mostra a nota abaixo retirada do A Tarde Online do dia 15/05/2008:
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O número total de 122 homicídios de homossexuais registrados em 2007 representa um aumento de 30% com relação aos registros de 2006 e dão ao Brasil o triste título de campeão mundial em crimes desse tipo, muito distante do México, que aparece em segundo lugar com 35 mortes, e dos Estados Unidos, terceiro, com 25. A Bahia, com 18 casos, é o estado com maior incidência desse tipo de crime. A região Nordeste concentra 2 entre cada 3 homícidos cometidos contra homossexuais no Brasil. Em 2007, foram 81 assassinatos. Somente nos quatro primeiros meses de 2008, já foram registrados 43 casos no Brasil, sendo 4 deles na Bahia.
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Isso preocupa o sumo pontífice? Penso que não, já que o Vaticano é contrário à resolução da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre o reconhecimento da livre orientação sexual e da identidade de gênero como direitos humanos e porque o Sr. Ratzinger XVI acredita, conforme suas declarações, que a homossexualidade e a transexualidade são uma “destruição da obra de Deus”. Sugiro uma reflexão sobre essa questão e sobre a postagem de ANO NOVO a partir das imagens abaixo e dos versos do Caetano Veloso.
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Garotos a brincar no porto de Jope, região metropolitana de Tel Aviv (Israel), da mesma maneira como fazem os garotos do porto da Barra em Salvador (Brasil).
Fotos: Miguel Nicolaevsky (esq.) e Victor Balde (dir.)
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Enquanto os homens exercem
Seus podres poderes
Índios e padres e bichas
Negros e mulheres
E adolescentes
Fazem o carnaval...
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Criança a comer migalhas para matar a fome em alguma parte do planeta
(foto achada no site de busca Google - autoria não encontrada)
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Enquanto os homens exercem
Seus podres poderes
Morrer e matar de fome
De raiva e de sede
São tantas vezes
Gestos naturais...
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Penso que outros são os riscos e flagelos que ameaçam a humanidade. Sua Santidade, o papa Bento XVI, deveria se preocupar mais com os flagelos que separam a humanidade e as famílias pela dor, pelo sofrimento e pelo ódio e menos com o amor que une os iguais (por Sílvio Benevides).

segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

Da série CURIOSIDADES URBANAS

Da Vila do Pereira à fundação de Salvador

A história oficial da cidade do Salvador tem início em 1549, ano da sua fundação, ocorrida sob a batuta do fidalgo português Tomé de Souza, primeiro Governador Geral do Brasil colonial. No entanto, para além da oficialidade histórica, alguns acontecimentos marcaram a vida da cidade antes mesmo de Tomé de Souza desembarcar onde hoje é o Porto da Barra com o intuito de fundar a Fortaleza do Salvador na Baía de Todos os Santos. Algumas povoações e vilas já existiam na região em torno do sítio onde Salvador foi erguida, a exemplo da Vila do Pereira (ou Povoação do Pereira), que a partir da fundação da fortaleza passou a se chamar Vila Velha. O nome Vila do Pereira, construída nas proximidades do atual Forte São Diogo, no Porto da Barra, se deve ao dono da Capitania da Bahia de Todos os Santos, o também fidalgo português Francisco Pereira Coutinho, homem de maus bofes. Foi-lhe outorgada pelo rei D. João III em 1534 por conta dos serviços que ele prestara à Coroa portuguesa.

Por volta de 1540 estourou uma guerra que destruiu por completo a Vila do Pereira. Consta que a peleja se deu entre os colonos portugueses, cerca de 100, e mais de mil Tupinambás. Essa revolta resultou da maneira como os colonos passaram a administrar a vila, assim como a região em torno, e ao tratamento dispensado aos índios. Gradativamente, eles perderam suas terras e foram reduzidos à condição de escravos. Alguns chegaram a ser vendidos para outras capitanias.

Com a derrota e a conseqüente tomada da vila pelos Tupinambás, Pereira Coutinho fugiu para Porto Seguro. Sua ausência motivou os franceses a retomar os planos de se instalarem na capitania. Frente à ameaça francesa, Pereira Coutinho decidiu regressar à vila. Ao retornar, em 1546, seu barco naufragou na costa sul da Ilha de Itaparica. Foi capturado e posteriormente devorado pelos Tupinambás num ritual antropofágico. Relatos de historiadores dos nossos tempos indicam que fora um índio com apenas cinco anos de idade, irmão de um outro que o próprio Pereira Coutinho mandara matar, quem desferiu com seu tacape o golpe fatal que liquidou com toda a fidalguia do donatário.

Fatos como esse, assim como a vulnerabilidade do terreno no que tange a possíveis ataques de invasores e inimigos da Coroa, fez o rei de Portugal, D. João III, determinar: “E assim informado que o lugar em que ora está a dita cerca não é conveniente para ali fazer assentar a fortaleza e povoação que ora ordeno que se faça, e será necessário fazer-se em outra parte mais para dentro da bahia” (In: LEITE, Anésio Ferreira. “Cidade ao redor da baía”. Revista da Bahia, v.32, n. 34, dez/2001). Por conta disso, a fortaleza que deu origem à cidade do Salvador foi construída no platô que se estende da Rua Chile ao Terreiro de Jesus. Nesse local havia as condições necessárias para garantir tanto a segurança e sobrevivência dos colonos quanto, principalmente, das riquezas por eles produzida (por Sílvio Benevides).

ADENDO

Para não confundir antropofagia com canibalismo, reproduzo aqui um trecho da obra de Luís da Câmara Cascudo que nos ajuda a entender o papel da antropofagia nas sociedades indígenas: “Todos os registros dos séculos XVI e XVII, de origem ameraba, incluem a impressão do cerimonial ritual no ato canibalesco. Não há exemplo de exercer-se a prática sem atender às normas precípuas da tradição. Não se persegue e caça o homem para devorá-lo. Nem todos os prisioneiros merecem o sacrifício. Os cadáveres não são objeto do destino androfágico. É indispensável colher os homens vivos e durante a ação guerreira. Conduzí-los para as aldeias, alimentando-os fartamente, tratando-os com certas regalias e direitos, inclusive a oferta de mulheres. São adornados vistosamente e armados para a simulação defensiva. Uma multidão assiste à crueldade oficial. Convidados ilustres, chefes temidos, guerreiros famosos. Não pode haver clandestinidade no assassinato ritual. Quem o mata não pode participar do banquete. Fica sob a exigência de preceitos incontáveis, com imposição especial, mudo, quase imóvel, com nova pintura, sangria de dente de cutia, tatuagem, e toma novo nome, nome ilustre que custou a vida de um homem valente…” (In: Civilização e Cultura. Itatiaia: Belo Horizonte, 1983).
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Foto: Sílvio Benevides a partir de detalhe do painel do foyer do Teatro Castro Alves.

terça-feira, 16 de dezembro de 2008

O ato de governar

O texto abaixo, escrito por Carlos Drummond de Andrade, propõe uma reflexão sobre o ato de governar. Se consultarmos o dicionário, encontraremos várias acepções, que vão desde exercer autoridade soberana e continuada sobre outrem até deixar-se influenciar por, ou ainda orientar-se, regular-se. Entretanto, creio que a acepção mais adequada ao conto do Drummond e ao contexto da nossa cultura política é pensar o ato de governar como a ação de tratar devidamente de seus próprios negócios e interesses. Nada mais adequado ao atual governo soteropolitano. A reflexão está feita. O resto é com o leitor.
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Os garotos da rua resolveram brincar de Governo, escolheram o Presidente e pediram-lhe que governasse para o bem de todos.
- Pois não – aceitou Martim. – Daqui por diante vocês farão meus exercícios escolares e eu assino. Clóvis e mais dois de vocês formarão a minha segurança. Januário será meu Ministro da Fazenda e pagará o meu lanche.
- Com que dinheiro? – atalhou Januário.
- Cada um de vocês contribuirá com um cruzeiro por dia para a caixinha do Governo.
- E o que é que nós lucramos com isso? – perguntaram em coro.
- Lucram a certeza de que tem um bom Presidente. Eu separo as brigas, distribuo tarefas, trato de igual para igual com os professores. Vocês obedecem, democraticamente.
- Assim não vale. O Presidente deve ser nosso servidor, ou pelo menos saber que todos somos iguais a ele. Queremos vantagens.
- Eu sou o Presidente e não posso ser igual a vocês, que são presididos. Se exigirem coisas de mim, serão multados e perderão o direito de participar da minha comitiva nas festas. Pensam que ser Presidente é moleza? Já estou sentindo como este cargo é cheio de espinhos.
Foi deposto e dissolvida a República.

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(ANDRADE, Carlos Drummond de. Governar. In: Histórias para o Rei. Rio de Janeiro: Record, 1998).
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Foto: Sílvio Benevides a partir de grafite Montréalais

segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

Tradicionalmente pós-moderna

A religiosidade é uma das principais características da cultura baiano-soteropolitana. Religiosidade sincrética, que reinterpreta e combina em um único universo, diferentes tradições míticas, seja de origem européia, ameríndia ou africana. A mistura está na essência da devoção dos baianos, mesmo entre os mais conservadores. Tal qual a Dona Flor do Jorge Amado (vide postagem do dia 28 de outubro de 2008), o povo baiano também escolheu não escolher ao se relacionar com o divino. Tomemos como exemplo o culto a Nossa Senhora da Conceição, padroeira de Salvador, cuja celebração ocorre em 08 de dezembro.

Por ocasião da chegada às terras brasileiras do fidalgo português Tomé de Sousa, fundador de Salvador e primeiro Governador-Geral do Brasil, uma capela em louvor a Nossa Senhora Imaculada Conceição foi erguida à beira da praia. Um dos primeiros registros sobre a existência do pequeno templo (hoje uma suntuosa basílica no bairro do Comércio, na Cidade Baixa) é o de Gabriel Soares de Sousa: “no principal desembocadouro está uma fraca ermita de Nossa Senhora da Conceição, que foi a primeira casa de oração e obra em que Tomé de Sousa se ocupou” (Notícias do Brasil. Lisboa: Alfa, 1989).

O culto a Nossa Senhora da Conceição rapidamente se espalhou e com a chegada dos africanos ele foi re-significado. Nossa Senhora da Conceição, que, de acordo com a tradição católica, é mãe da humanidade, encontrou-se com Iemanjá, que na tradição yorubá é a mãe de todos os orixás. A partir do elemento da maternidade, comum a ambas as divindades, duas tradições religiosas tão diferentes entre si, combinaram-se em um único e harmonioso sentimento religioso por meio da devoção dos fiéis. As razões desta combinação estão ligadas ao sincretismo, que uniu em um mesmo universo alguns santos católicos “com certos deuses trazidos da África pelos escravos quando de sua imigração forçada ao Brasil” (VERGER, Pierre. Notícias da Bahia. Salvador: Corrupio, 1999).

Mas o sincretismo só pode ser entendido na relação entre os devotos e as divindades e não entre as divindades sincretizadas. Isso ocorre porque o sincretismo resulta dos “sentimentos de uma população que através da sua cultura aprendeu, desde cedo, a criar e recriar símbolos, preencher brechas e abrir outras, apontando caminhos e perspectivas” (CAETANO, Vilson. Orixás, santos e festas. Salvador: Editora UNEB, 2003). É exatamente nessa capacidade de criar e recriar símbolos e de apontar caminhos para o porvir que reside toda a grandeza da cultura baiano-soteropolitana, que já nasceu tradicionalmente pós-moderna. Mas eu desconfio que poucos se deram conta do quão precioso é esse nosso açúcar excelente. A maioria permanece de olhos esbugalhados apenas para as drogas inúteis (por Sílvio Benevides).
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Foto: Nossa Senhora da Conceição por Sílvio Benevides

Juntar para espalhar

No último dia 07 de dezembro de 2008 foi encerrada no Teatro Castro Alves, com os shows dos magníficos e estupendos André Abujamra e Fernanda Takai, a oitava edição do Mercado Cultural. Esse ano o tema foi JUNTAR PARA ESPALHAR. De acordo com Ruy Cezar Silva e Benjamin Taubkin, organizadores do evento, “esta foi a frase proferida por Hermato Pascoal durante apresentação na Concha Acústica na primeira edição do Mercado Cultural em 1999. Hermeto usou a expressão para definir o próprio Mercado, referindo-se à intenção de juntar (promover encontros, transmissão de conhecimentos e troca de experiências) e espalhar (construir intercâmbios, distribuir a produção, trabalhar em rede). Tudo isso sob a aura de um projeto que nasceu com a missão de sistematizar, promover e distribuir trabalhos autorais de qualidade, representativos da produção artística independente...retomamos esta frase como tema e meta deste ponto de encontro afetivo, intelectual e espiritual de uma comunidade artística que segue aspirando um futuro cooperativo, com ampliação do convívio entre os criadores e ativistas da cultura das distantes regiões do planeta” (trecho extraído do catálogo promocional do evento e disponível no site do Instituto Via Magia).

O Mercado Cultural é, atualmente, o que há de melhor na cena cultural soteropolitana. Primeiro porque a diversidade é o seu motor propulsor. Diversidade que encanta e fascina, pois seus contornos fazem do mundo um lugar deveras interessante e por demais aprazível para se viver, apesar das vicissitudes. Segundo, porque é um espaço onde é possível desfrutar imagens, cores e sons plurais comprometidos não com uma ordem mercadológica, mas com a arte pela arte e tudo de bom que ela pode oferecer. Isso é um alento para olhos e ouvidos fatigados pela mesmice estúpida imposta pela indústria cultural através de seus veículos de comunicação de massa, que transformam tudo e todos em meros objetos descartáveis de consumo. Terceiro, o Mercado Cultural proporciona uma viagem artística e estética ímpar, na qual é possível ir da Catalunha a Madagascar, de Madagascar a Israel, passando por Cuba, Venezuela, Colômbia, Bolívia e Brasil, em um breve espaço de três dias. Não há outro lugar em Salvador onde isso seja possível. Só no Mercado Cultural. Vida longa ao Mercado Cultural! (por Sílvio Benevides)
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Imagem: capa do catálogo de divulgação