segunda-feira, 31 de outubro de 2011

O dia D

A data de hoje, 31 de outubro, dia do aniversário de Carlos Drummond de Andrade, nascido na cidade mineira de Itabira, em1902, foi transformada pelo Instituto Moreira Salles, entidade que cuida do valiosíssimo acervo do poeta, no Dia D – Dia Drummond, que passa a figurar no calendário cultural do País. “Não queríamos que um material tão rico ficasse limitado aos muros do instituto”, disse Flávio Moura, um dos curadores da festa, ao lado do poeta Eucanaã Ferraz. “Nossa inspiração foi o Bloomsday, que acontece todo 16 de junho, quando os irlandeses (e todo o mundo) comemoram a vida e a obra de James Joyce”, completou. Da presente data em diante passaremos, pois, a comemorar o dia Drummond, aquele cuja pena traduziu em palavras sentimentos que apenas podem ser ouvidos por meio dos batimentos cardíacos. O Carlos Drummond de Andrade sempre esteve e sempre estará presente na série Poemas Falados do Salvador na sola do pé, porque ele é o anjo torto que nos ensinou com seus versos raros a arte de voar a gauche pela vida a fora. E como é bom ser gauche na vida!

Para marcar esse dia, um dos meus poemas prediletos, O HOMEM, AS VIAGENS, que diz: “O homem, bicho da Terra tão pequeno, chateia-se na Terra, lugar de muita miséria e pouca diversão. Faz um foguete, uma cápsula, um módulo, toca para a Lua, desce cauteloso na Lua, pisa na Lua, planta bandeirola na Lua, experimenta a Lua, coloniza a Lua, civiliza a Lua, humaniza a Lua. Lua humanizada: tão igual à Terra. O homem chateia-se na Lua. Vamos para Marte! Ordena a suas máquinas. Elas obedecem. O homem desce em Marte, pisa em Marte, experimenta, coloniza, civiliza, humaniza Marte com engenho e arte. Marte humanizado, que lugar quadrado. Vamos a outra parte? Claro! Diz o engenho sofisticado e dócil. Vamos a Vênus. O homem põe o pé em Vênus, vê o visto – é isto? Idem, idem, idem...O homem funde a cuca se não for a Júpiter proclamar justiça junto com injustiça, repetir a fossa, repetir o inquieto repetitório. Outros planetas restam para outras colônias. O espaço todo vira Terra-a-Terra. O homem chega ao Sol ou dá uma volta só pra te ver? Não vê que ele inventa roupa insiderável de viver no Sol. Põe o pé e: mas que chato é o Sol, falso touro espanhol domado. Restam outros sistemas fora do solar a colonizar. Ao acabarem todos só resta ao homem (estará equipado?) a dificílima dangerosíssima viagem de si a si mesmo: pôr o pé no chão do seu coração, experimentar, colonizar, humanizar o homem, descobrindo em suas próprias inexploradas entranhas a perene, insuspeitada alegria de conviver”. Na voz do próprio Drummond, ao som de Bach, interpretado pelo Yo Yo Ma, o meu Poema Falado preferido. Boa áudio-leitura! (por Silvio Benevides).



Imagem: Agência Estado

segunda-feira, 17 de outubro de 2011

A defesa do meio ambiente é uma luta anticapitalista

Não há dúvida que a questão ambiental é uma das mais urgentes na atualidade. Trata-se de uma questão de sobrevivência, não do planeta, mas, sim, da humanidade. Trata-se, também, de uma questão moral. Como assim? Muitos, talvez, se perguntem. A resposta é simples. A humanidade não encontrará soluções adequadas para a questão da degradação ambiental se não promover uma mudança radical de valores e padrões morais/éticos. A primeira mudança a ser promovida deve ser na idéia de que a vida humana é a mais valorosa do planeta e, por isso, a única que importa. Todas as vidas existentes na terra são importantes, porque as inúmeras espécies existentes são interdependentes. O equilíbrio ambiental somente se efetivará quando essa consciência estiver, de fato, disseminada e profundamente enraizada nas consciências humanas. Talvez devêssemos promover um resgate significativo de valores e padrões culturais de sociedades dizimadas pelo colonialismo mercantilista e pelo imperialismo capitalista, ambos vistos por séculos como modelos civilizatórios ideais. Desse ponto advém outra constatação. Se não houver uma mudança radical dos padrões civilizatórios atuais, o que implica, também, uma mudança radical no modo de produção, não haverá futuro promissor para a humanidade ou para qualquer outra forma de vida que habite este planeta. Urge modificarmos a maneira como produzimos e consumimos, pois o modo como as coisas estão e são tem se revelado extremamente nocivo.

Por e-mail me enviaram um texto no qual uma senhora idosa é interpelada pelo caixa do supermercado, que, preocupado com a questão ambiental, lhe diz que sacolas plásticas não são amigáveis com o meio ambiente e, por isso, ela deveria ter levado suas próprias sacolas para as compras ou, então, comprar uma retornável fornecida pelo próprio supermercado pelo valor irrisório de R$ 3,00. Desculpando-se, a senhora responde ao caixa politicamente correto que em seu tempo de juventude não havia preocupação com o meio ambiente, talvez fosse esta a razão dela sempre se esquecer de levar suas próprias sacolas quando ia às compras. Do alto da sua elevada consciência ambiental, o rapaz afirma ser este o grande problema dos nossos dias, ou seja, as gerações mais velhas não se preocuparam o suficiente com a questão ambiental. Sem discordar, a velha senhora se sentiu na obrigação de complementar o argumento do jovem caixa, informando-lhe que nos idos tempos da sua juventude “as garrafas de leite, de refrigerante e cerveja eram devolvidas à loja. A loja mandava de volta para a fábrica, onde eram lavadas e esterilizadas antes de cada reuso, e eles, os fabricantes de bebidas, usavam as garrafas, umas tantas outras vezes”. E a senhora não se restringiu a este exemplo, apenas.

“Realmente, continuou ela, não nos preocupávamos com o ambiente no nosso tempo. Subíamos as escadas, porque não havia escadas rolantes nas lojas e nos escritórios. Caminhávamos até o comércio, ao invés de usar o nosso carro de 300 cavalos de potência a cada vez que precisávamos ir a dois quarteirões para comprar pão, por exemplo. Mas você está certo. Nós não nos preocupávamos com o ambiente. Até então, as fraldas de bebês eram lavadas, porque não havia fraldas descartáveis, tampouco absorventes íntimos descartáveis para as mulheres quando ficavam menstruadas. A secagem das roupas não era feita nestas máquinas bamboleantes de 220 volts. A energia solar e eólica é que realmente secava nossas roupas. Os meninos pequenos usavam as roupas que tinham sido de seus irmãos mais velhos, e não roupas sempre novas. Mas é verdade: não havia preocupação com o ambiente, naqueles dias. Naquela época só tínhamos somente uma TV ou rádio em casa, e não uma TV em cada quarto. E a TV tinha uma tela do tamanho de um lenço, não um telão do tamanho de um estádio; que, depois, quase ninguém sabe como será descartado. Também não tínhamos controles remotos, laptops e aparelhos celulares com suas baterias altamente nocivas ao meio ambiente. Na cozinha, tínhamos que bater tudo com as mãos porque não havia máquinas elétricas, que fazem tudo por nós. Quando embalávamos algo frágil para enviar pelo correio, usávamos jornal amassado para protegê-lo, não plástico-bolha ou pellets de plástico que duram cinco séculos para começar a degradar. Naqueles tempos não se usava um motor a gasolina apenas para cortar a grama. Utilizava-se um cortador de grama que exigia músculos. O exercício era extraordinário, e não precisávamos ir a uma academia para usar esteiras elétricas. Mas você tem razão: não havia naquela época preocupação com o ambiente. Bebíamos em copos de vidro quando estávamos com sede, em vez de usar copos plásticos e garrafas pet que agora lotam os oceanos. Recarregávamos as canetas com tinta ao invés de comprar novas. Os homens barbeavam-se com navalhas e, por isso, deixavam de jogar no lixo aparelhos descartáveis e poluentes só porque a lâmina ficou sem corte. Na verdade, tivemos uma onda verde naquela época, quando as pessoas tomavam o bonde ou ônibus e os meninos iam para a escola a pé ou em suas bicicletas, ao invés de usar a mãe como um serviço de táxi 24 horas. Tínhamos apenas uma tomada em cada quarto, e não um quadro de tomadas em cada parede para alimentar uma dúzia de aparelhos eletrônicos. Também não precisávamos de um GPS para receber sinais de satélites a milhas de distância no espaço, só para encontrar a pizzaria mais próxima”. Satisfeita, a senhora conclui com uma provocação destinada à reflexão: “não é risível que a atual geração fale tanto em meio ambiente, mas não queira abrir mão de nada e não pense em viver um pouco como na minha época”?

Não se trata aqui de defender um retorno ao passado. É óbvio que ninguém deseja cruzar o Atlântico rumo à Europa, por exemplo, do mesmo modo faziam os antigos navegantes em suas caravelas movidas pela força dos ventos. Definitivamente, não é isso que está em debate aqui. Entretanto, é preciso considerar que a fictícia senhora, de fato, tem razão, embora ela tenha se esquecido de admitir que, sim, as gerações mais velhas não se preocuparam com a questão ambiental porque estavam empenhadas em promover o desenvolvimento tecnológico e econômico em bases capitalistas. Muitas vezes a preocupação ambiental/ecológica dos dias de hoje chega a ser risível, não tanto pelos argumentos, mas, sobretudo, pela total ausência de politização dos fatos. Para salvar o meio ambiente da sua total degradação é preciso mudar maneiras de agir e pensar; é preciso transformar o modo de produção capitalista, que tem se mostrado cada vez mais insustentável sob todos os aspectos. Isso implica, também, em mudar todo um conjunto de relações sociais nos mais variados âmbitos, do político-econômico ao religioso, passando, claro, pelo educacional. Sem essas mudanças, caros defensores do discurso ambientalmente correto, não haverá futuro nem para o meio ambiente, nem para a humanidade. E nem adianta dizer que cada um fazendo a sua parte, como, por exemplo, fazer xixi durante o banho para evitar dar descarga ou tomar banhos rápidos de no máximo cinco minutos para diminuir o consumo de água, vai resolver o problema. Não vai, porque outro valor que precisamos resgatar é o sentimento de coletividade. Problemas coletivos exigem soluções pensadas, refletidas, debatidas e encontradas coletivamente e não individualmente. O individualismo é tão nocivo ao meio ambiente quanto a bomba atômica (por Sílvio Benevides).


Imagem: Lady Bug heart, por Tiago Sousa

segunda-feira, 10 de outubro de 2011

Câmara aprova o Estatuto da Juventude

O Plenário da Câmara Federal aprovou o Projeto de Lei 4529/04, que institui o Estatuto da Juventude, com princípios e diretrizes para o Poder Público criar e organizar políticas para essa idade, considerada pelo texto como a faixa de 15 a 29 anos. A matéria, aprovada na forma de um substitutivo, em votação simbólica, será enviada para análise do Senado.

A autoria do projeto é da comissão especial de políticas públicas para a juventude. No acordo feito antes da votação, a relatora Manuela d’Ávila (PCdoB-RS) ajustou o texto sobre a inclusão de temas relacionados à sexualidade nos currículos escolares.

A relatora manteve o combate a todas as formas de discriminação, assim como o respeito às crenças. “Pela primeira vez, produzimos um acordo que garante os direitos para a comunidade LGBT e também a liberdade de credo tão aclamada e exigida pelos evangélicos. Agradeço a todos os deputados que participaram da construção desse acordo”, disse a relatora.

Outro ponto alterado se refere ao transporte de estudantes. Em vez de prever o direito ao transporte gratuito, o texto aprovado diz que os programas suplementares de transporte escolar serão progressivamente estendidos aos jovens estudantes de todos os níveis educacionais, no campo e na cidade.

Já o desconto de 50% nas passagens intermunicipais e interestaduais deverá obedecer às legislações federal, estaduais e municipais. Nos dois casos, os recursos para o subsídio deverão ser suportados, preferencialmente, com dotações orçamentárias específicas.

Para melhorar o ensino, Manuela d´Ávila incluiu como prioridade do Poder Público a universalização da educação em tempo integral.

O presidente da Câmara, Marco Maia, elogiou a aprovação do estatuto, que já tramita há mais de sete anos na Casa. Para ele, haverá um avanço no tratamento que o Brasil deve dar à juventude nos próximos anos. Ele ressaltou que a proposta estabelece políticas claras e concretas de atuação das entidades públicas.

O deputado Domingos Neto (PSB-CE), que é presidente da Frente Parlamentar da Juventude, destacou o acordo feito com a Frente Parlamentar Evangélica que permitiu a aprovação do projeto. “Tivemos a oportunidade de, depois de sete anos tramitando nesta Casa, ver o extraordinário trabalho da deputada Manuela d'Ávila que, em conjunto com a Frente Parlamentar da Juventude, conseguiu uma vitória histórica para o País”, afirmou.

Em seu substitutivo, Manuela d´Ávila também atendeu a apelo do deputado Vanderlei Macris (PSDB-SP) para manter no texto a proibição de propagandas de bebidas com qualquer teor alcoólico quando esta tiver a participação de jovem menor de 18 anos.

Esse tópico faz parte dos direitos de atenção à saúde, cuja política deverá ter como uma das diretrizes a garantia de inclusão do tema no currículo escolar.

Entre os assuntos que deverão ser tratados pelos professores, destacam-se os relativos ao consumo de álcool, drogas, às doenças sexualmente transmissíveis, ao planejamento familiar e ao impacto da gravidez, seja planejada ou não.

Quanto ao desporto, o texto determina que as escolas com mais de 200 alunos, ou conjunto de escolas que agreguem esse número, deverão buscar um local apropriado para a prática de atividades poliesportivas.

A deputada Manuela, na época do debate na comissão especial, abriu uma comunidade virtual no e-Democracia para receber contribuições da sociedade. Algumas delas foram acatadas e acrescentadas ao texto do substitutivo aprovado no Plenário (Fonte: Agência Câmara de Notícias).

Imagem: Chris Heads

Situação-problema que justifica a realização da educação pelo respeito à Diversidade Sexual nas escolas

Estudos publicados nos últimos cinco anos vêm demonstrando e confirmando cada vez mais o quão a homo-lesbo-transfobia (medo ou ódio irracionalmente às pessoas LGBT) permeia a sociedade brasileira e está presente nas escolas. A pesquisa intitulada “Juventudes e Sexualidade”, realizada pela Unesco no ano 2000 e publicada em 2004, foi aplicada em 241 escolas públicas e privadas em 14 capitais brasileiras. Segundo resultados da pesquisa, 39,6% dos estudantes masculinos não gostariam de ter um colega de classe homossexual, 35,2% dos pais não gostariam que seus filhos tivessem um colega de classe homossexual, e 60% dos professores afirmaram não ter conhecimento o suficiente para lidar com a questão da homossexualidade na sala de aula.

O estudo “Revelando Tramas, Descobrindo Segredos: Violência e Convivência nas Escolas”, publicado em 2009 pela Rede de Informação Tecnológica Latino-Americana, baseada em uma amostra de 10 mil estudantes e 1.500 professores(as) do Distrito Federal, e apontou que 63,1% dos entrevistados alegaram já ter visto pessoas que são (ou são tidas como) homossexuais sofrerem preconceito; mais da metade dos/das professores(as) afirmam já ter presenciado cenas discriminatórias contra homossexuais nas escolas; e 44,4% dos meninos e 15% das meninas afirmaram que não gostariam de ter colega homossexual na sala de aula.

A pesquisa “Preconceito e Discriminação no Ambiente Escolar” realizada pela Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas, e também publicada em 2009, baseou-se em uma amostra nacional de 18,5 mil alunos, pais e mães, diretores, professores e funcionários, e revelou que 87,3% dos entrevistados têm preconceito com relação à orientação sexual.

A Fundação Perseu Abramo publicou em 2009 a pesquisa “Diversidade Sexual e Homofobia no Brasil: intolerância e respeito às diferenças sexuais”, que indicou que 92% da população reconheceram que existe preconceito contra LGBT e que 28% reconheceram e declarou o próprio preconceito contra pessoas LGBT, percentual este cinco vezes maior que o preconceito contra negros e idosos, também identificado pela Fundação.

Entre as consequências da homo-lesbo-transfobia na vida adulta, a mais grave sem dúvida é o assassinato desenfreada de pessoas LGBT no Brasil. Através dos meios de comunicação o Grupo Gay da Bahia monitora esse fenômeno, e revelando que de 1980 a 2010, houve 3.446 assassinatos motivados pela orientação sexual ou identidade de gênero das vítimas registrados por esta fonte, uma vez que não são coletados dados oficiais nacionais sobre este tipo de assassinato. A tendência é de aumento, com 260 assassinatos no Brasil no ano de 2010, dando uma média de 0,71 assassinatos por dia.

Essas diversas e conceituadas fontes não deixam dúvidas de que há muito a ser feito para diminuir a homo-lesbo-transfobia, e uma das instituições que mais podem influenciar positivamente nesse processo é a escola. Muito trabalho já vem sendo feito nessa área e é importante destacar as recomendações aprovadas na Conferência Nacional de Educação Básica em relação à diversidade sexual, dentre as quais citamos:


• Evitar discriminações de gênero e diversidade sexual em livros didáticos e paradidáticos utilizados nas escolas;
• Ter programas de formação inicial e continuada em sexualidade e diversidade;
• Promover a cultura do reconhecimento da diversidade de gênero, identidade de gênero e orientação sexual no cotidiano escolar;
• Evitar o uso de linguagem sexista, homofóbica e discriminatória em material didático-pedagógico;
• Inserir os estudos de gênero e diversidade sexual no currículo das licenciaturas.

A Conferência Nacional LGBT (2008) aprovou 561 recomendações para políticas públicas para pessoas LGBT em diversas áreas, as quais foram sistematizadas no Plano Nacional de Promoção da Cidadania e Direitos Humanos de LGBT, lançado em 14 de maio de 2009. O Plano prevê quinze ações a serem executadas pelo Ministério da Educação e é uma importante ferramenta para a promoção da inclusão e do respeito à diversidade nas escolas.

A Conferência Nacional de Educação (2010), no seu Eixo Temático VI, aprovou mais de 20 recomendações relativos a gênero e diversidade sexual.

O Plano Nacional de Educação (aprovado pela Lei nº 10.172 de 9 de janeiro de 2001), no seu diagnóstico do Ensino Fundamental, afirmou que “a exclusão da escola de crianças na idade própria, seja por incúria do poder público, seja por omissão da família e da sociedade, é a forma mais perversa e irremediável de exclusão social, pois nega o direito elementar de cidadania, reproduzindo o círculo da pobreza e da marginalidade e alienando milhões de brasileiros de qualquer perspectiva de futuro”;

O Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos reitera que “o Estado brasileiro tem como principio a afirmação dos direitos humanos como universais, indivisíveis e interdependentes e, para sua efetivação, todas as políticas públicas devem considerá-los na perspectiva da construção de uma sociedade baseada na promoção da igualdade de oportunidades e da equidade, no respeito à diversidade e na consolidação de uma cultura democrática e cidadã”. As pesquisas citadas nesse texto podem ser consultadas CLICANDO AQUI. Abaixo um vídeo para que pais, estudantes, professores, pedagogos e funcionários de escolas e demais estabelecimentos de ensino reflitam sobre a questão aqui levantada (Fonte: ABGLT).


O vídeo abaixo, intitulado NOVAMENTE, é uma parceria entre Grupo Arco-Íris e UFRJ. O curta tem dois pólos opostos que se chocam. Uma escola. Dois casais. Um hétero, outro homo. Para cada um, a escola vai reservar um tratamento diferente. O cotidiano de dois jovens que misturam preconceitos. Para um, somente uma brincadeira; para outro, opressão diária. Excelente objeto de reflexão sobre o tema escola sem homofobia para estudantes, professores, pedagogos, funcionários de escolas e, também, para os pais.






Imagem: André Buono

quinta-feira, 6 de outubro de 2011

Steve Jobs, ora essa façam-me o favor!

As inovações tecnológicas sempre foram responsáveis por provocar mudanças significativas na história da humanidade. É assim desde os tempos da pedra lascada. O domínio de técnicas e o emprego de tecnologias permitiram, por exemplo, que o ser humano deixasse as cavernas e passasse a construir suas habitações; abandonasse o nomadismo e abraçasse a agricultura; tornasse o trabalho menos exaustivo e encurtasse distâncias entre os diferentes lugares por meio, entre tantas outras coisas, da invenção da roda. Tais informações não deveriam ser novidade para ninguém que tenha ido além do ensino básico. Por isso me espanta a cobertura sobre a morte do fundador da Apple, o tal Steve Jobs. Longe de mim querer negar a inteligência, a genialidade, a competência e a importância do falecido na história das comunicações, mas daí a dizer que ele foi um revolucionário, que transformou o mundo, que inventou a contemporaneidade, que a história da humanidade se divide em antes e depois dele é mais que um exagero. É uma estupidez sem tamanho.

Em quase todas as notícias e matérias da internet, da televisão e da mídia impressa, o Steve Jobs tem sido descrito como a pedra filosofal da humanidade. O que teria sido desse punhado de gente sem o magnífico Sr. Jobs? Nada. Talvez a humanidade sequer existisse. Causa-me espanto ver como de uma hora para outra um capitalista que, como qualquer outro grande capitalista, especialmente os de alcance mundial, visava tão somente o lucro e, provavelmente, por conta disso, seu caráter não devia se pautar por coisas supérfluas como escrúpulos de qualquer natureza ou ética, passou a ser classificado como o grande revolucionário dos últimos séculos.

Sei bem que uma revolução depende muito do ponto de vista ou das referências de cada um. Por isso compreendo o exagero estúpido das coberturas jornalísticas em torno da morte do magnata fundador da Apple. Mas, como disse, as referências de cada um é que fazem deste ou daquele fato uma revolução. Pois bem, para mim revolução significa o fim de todo e qualquer tipo de opressão, seja essa política, econômica, religiosa, cultural ou sexual. Revolução é distribuição de renda. Revolução é acabar com o tráfico de drogas, de armas e de seres humanos. Revolução é transformar o atual estágio das coisas que fazem com que a grande maioria da população mundial pague pelos erros, ganância ou incompetência de alguns poucos que nunca são punidos. Pelo contrário, são sempre premiados, seja nos tempos de calmaria ou de crise. Revolução é transformar um modo de produção que valoriza o mercado em detrimento de seres humanos. Revolução é acabar com a miséria. Revolução não é multiplicar iPads, iPhones, iPods. Revolução é não permitir que seres humanos morram porque não têm acesso ao básico, isto é, COMIDA. Eu bem sei, também, que, parafraseando os Titãs, a gente não quer só comida. A gente quer, a gente precisa de comida, educação, diversão e arte. Mas sem comida, senhoras e senhores, não podemos ter educação, diversão e arte. Por isso, senhoras e senhores, só me venham falar de revolução quando a comida puder ser acessada por todos, sem exceção (por Sílvio Benevides).

Imagens: Alecrim e Daniel Adel (The New York Times).

terça-feira, 4 de outubro de 2011

POEMA FALADO: Oração de São Francisco de Assis

No dia de São Francisco de Assis, o Salvador na sola do pé homenageia este que foi, sem dúvida, uma dos maiores homens que a humanidade gerou, o Pobrezinho de Assis. Tal qual Jesus Cristo, o legado de São Francisco é um legado de amor, respeito e paz entre os seres que habitam este planeta, como pode ser visto na sua Oração pela Paz, que traz em seus versos uma mensagem cunhada na era medieval, mas cada vez mais urgente e necessária no mundo contemporâneo. Eis o texto: “Senhor, fazei-me instrumento de vossa paz. Onde houver ódio, que eu leve o amor. Onde houver ofensa, que eu leve o perdão. Onde houver discórdia, que eu leve a união. Onde houver dúvida, que eu leve a fé. Onde houver erro, que eu leve a verdade. Onde houver desespero, que eu leve a esperança. Onde houver tristeza, que eu leve a alegria. Onde houver trevas, que eu leve a luz. Ó Mestre, fazei que eu procure mais consolar, que ser consolado; compreender, que ser compreendido; amar, que ser amado, pois, é dando que se recebe, é perdoando que se é perdoado, e é morrendo que se vive para a vida eterna”.






Imagem: Franco Zeffirelli

É dando que se recebe

Há duas economias: a dos bens materiais e a dos bens espirituais. Elas seguem lógicas diferentes. Na economia dos bens materiais, quanto mais você dá bens, roupas, casas, terras e dinheiro, menos você tem. Se alguém dá sem prudência e esbanja perdulariamente acaba na pobreza.

Na economia dos bens espirituais, ao contrario, quanto mais dá, mais recebe, quanto mais entrega, mais tem. Quer dizer, quanto mais dá amor, dedicação e acolhida (bens espirituais) mais ganha como pessoa e mais sobe no conceito dos outros. Os bens espirituais são como o amor: ao se dividirem, se multiplicam. Ou como o fogo: ao se espalharem, aumentam.

Compreendemos este paradoxo se atentarmos para a estrutura de base do ser humano. Ele é um ser de relações ilimitadas. Quanto mais se relaciona, vale dizer, sai de si em direção do outro, do diferente, da natureza e até de Deus, quer dizer, quanto mais dá acolhida e amor mais se enriquece, mais se orna de valores, mais cresce e irradia como pessoa.

Portanto, é “dando que se recebe”. Muitas vezes se recebe muito mais do que se dá [...] Quando alguém de posses dá de seus bens materiais dentro da lógica da economia dos bens espirituais para apoiar aos que tudo perderam e ajudá-los a refazer a vida e a casa, experimenta a satisfação interior de estar junto de quem precisa e pode testemunhar o que São Paulo dizia: “maior felicidade é dar que receber”(At 20,35). Esse que não é pobre se sente espiritualmente rico.

Vigora, portanto, uma circulação entre o dar e o receber, uma verdadeira reciprocidade. Ela representa, num sentido maior, a própria lógica do universo como não se cansam de enfatizar biólogos e astrofísicos. Tudo, galáxias, estrelas, planetas, seres inorgânicos e orgânicos, até as partículas elementares, tudo se estrutura numa rede intrincadíssima de inter-retro-relações de todos com todos. Todos co-existem, inter-existem, se ajudam mutuamente, dão e recebem reciprocamente o que precisam para existir e co-evoluir dentro de um sutil equilíbrio dinâmico.

Nosso drama é que não aprendemos nada da natureza. Tiramos tudo da Terra e não lhe devolvemos nada nem tempo para descansar e se regenerar. Só recebemos e nada damos. Esta falta de reciprocidade levou a Terra ao desequilíbrio atual.

Portanto, urge incorporar, de forma vigorosa, a economia dos bens espirituais à economia dos bens materiais. Só assim restabeleceremos a reciprocidade do dar e do receber. Haveria menos opulência nas mãos de poucos e os muitos pobres sairiam da carência e poderiam sentar-se à mesa comendo e bebendo do fruto de seu trabalho. Tem mais sentido partilhar do que acumular, reforçar o bem viver de todos do que buscar avaramente o bem particular. Que levamos da Terra? Apenas bens do capital espiritual. O capital material fica para trás.

O importante mesmo é dar, dar e mais uma vez dar. Só assim se recebe. E se comprova a verdade franciscana segundo a qual “é dando que recebe” ininterruptamente amor, reconhecimento e perdão. Fora disso, tudo é negócio e feira de vaidades (por Leonardo Boff).

Imagem: Agda Camargo