segunda-feira, 25 de abril de 2011

Epidemia do ódio: o extermínio de homossexuais no Brasil

A violência é um fenômeno social gerado por múltiplas causas, porque múltiplos são os tipos de violência. Para cada tipo, uma causa distinta. A violência resultante do narcotráfico, por exemplo, não pode ser considerada a mesma coisa que a violência no trânsito ou a violência doméstica, ou, ainda, a violência gerada pela homofobia. Gays, lésbicas, travestis e transexuais são freqüentemente assassinados no Brasil por conta do puro e simples ódio, explícito ou não, que vários segmentos da sociedade difundem e/ou praticam seja por meio de palavras, gestos ou omissão. Para aqueles e aquelas que pensam que tudo isso dito até aqui é um exagero ou que a aprovação do Projeto de Lei que visa criminalizar a homofobia (PLC 122/2006) é um atentado contra a liberdade de expressão, de expressão do ódio, vale ressaltar, sugiro ler o relatório anual divulgado pelo Grupo Gay da Bahia (GGB) sobre a violência praticada contra a população LGBTT brasileira. Os resultados do relatório nos mostram que a não aprovação de uma lei que coíba a homofobia é que se configura num verdadeiro atentado à liberdade de expressão, da livre expressão da sexualidade, o que, em última instância, se converte em um abominável atentado à própria democracia (por Sílvio Benevides).

260 homossexuais foram assassinados no Brasil em 2010 – O Grupo Gay da Bahia (GGB), que há três décadas coleta informações sobre homofobia em nosso país, denuncia a irresponsabilidade do governo Lula/Dilma em garantir a segurança da comunidade LGBT: a cada dia e meio um homossexual brasileiro é assassinado, vítima da homofobia. Nunca antes na história desse país foram assassinados e cometidos tantos crimes homofóbicos. Nos três primeiros meses de 2011 já foram documentados 65 homicídios contra homossexuais.

A Bahia pelo segundo ano consecutivo lidera essa lista macabra: 29 homicídios, seguida de Alagoas, com 24 mortes, Rio de Janeiro e São Paulo com 23 cada. Rio Grande do Norte e Roraima registraram apenas um assassinato cada. Se relacionarmos a população total dos estados com o número de LGBT assassinados, Alagoas repete a mesma tendência dos últimos anos: é o Estado que oferece maior risco de morte para os homossexuais, cujo número de vítimas ultrapassa o total de todos os estados juntos da região Norte do país. Maceió igualmente é a capital onde mais gays são assassinados: com menos de um milhão de habitantes, registrou 9 homocídios, contra 8 em Salvador (3 milhões) , 7 no Rio de Janeiro (6 milhões) e surpreendentemente, 3 mortes na cidade de São Paulo, com 10 milhões de habitantes.

O Nordeste confirma ser a região mais homofóbica: abriga 30% da população brasileira e registrou 43% dos LGBT assassinados. 27% destes crimes letais ocorreram no Sudeste, 9% no Sul, 10% no Centro-Oeste, 10% no Norte. O risco de um homossexual do Nordeste ser assassinado é aproximadamente 80% mais elevado do que no sul/sudeste! 36% destes homicídios foram cometidos nas capitais, 64% nas cidades do interior.

Quanto a idade, 7% das vítimas eram “menor de idade” ao serem assassinados, 14% com menos de 20 anos; 46% menos de 30 anos, 6% na terceira idade. A faixa etária que apresenta maior risco de assassinato situa-se entre 20-29 anos: 28%. A vítima mais nova tinha 14 anos: a travesti Érica, morta com 14 tiros no Centro de Maceió e o mais velho, Josué Amorim, 78 anos, aposentado, assassinado por três rapazes a golpes de facão em sua residência em União dos Palmares (AL).

43% dos homossexuais foram mortos a tiros, 27% com facas, 18% vítimas de espancamento ou pedrada e 17%, sufocados ou enforcados. Vários destes crimes revelam o ódio da homofobia, sendo praticados com requintes de crueldade, tortura, empalamento, castração. A travesti Mauri, de Montalvânia, MG, foi morta com 72 facadas! 90% das travestis foram mortas a tiros na rua, enquanto gays morrem dentro de casa. As vítimas pertenciam a mais de 60 profissões, demonstrando a crueldade da homofobia em todos os segmentos sociais, predominando profissionais do sexo, cabeleireiros, estudantes, profissionais liberais, incluindo diversos pais de santo e padres.

O Grupo Gay da Bahia (GGB) disponibiliza em seu SITE as tabelas em que se baseiam este relatório anual assim como o manual “Gay vivo não dorme com o inimigo” como estratégia para erradicar os crimes homofóbicos. O professor Luiz Mott, responsável por este levantamento, desabafa: “O aumento de 113% de assassinatos nos últimos cinco anos é genocídio! O Brasil tornou-se o epicentro mundial de crimes contra homossexuais. A Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República não implementou em tempo hábil as deliberações do Programa Nacional de Direitos Humanos II, nem do Programa Brasil Sem Homofobia e da 1ª Conferencia Nacional GLBT. O GGBB está enviando denúncia contra o Governo Brasileiro junto à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) da Organização dos Estados Americanos (OEA) e à Organização das Nações Unidas (ONU), pelo crime de prevaricação e lesa humanidade contra os homossexuais.” A própria Senadora Marta Suplicy tem repetido na mídia: “A situação dos homossexuais piorou no Brasil. Os assassinatos aumentaram!” O GGB reivindica como medida emergencial a divulgação de outdoors em todos os Estados com mensagens diretas alertando os homossexuais a evitarem situações de risco e estimulando a população respeitar as minorias sexuais.

Para o presidente do GGB, Marcelo Cerqueira, “há três soluções contra os crimes homofóbicos: ensinar à população a respeitar os direitos humanos dos homossexuais através de leis afirmativas da cidadania LGBT, exigir que a Polícia e Justiça punam com toda severidade a homofobia e sobretudo, que os próprios gays e travestis evitem situações de risco, não levando desconhecidos para casa, evitando transar com marginais.” Neste ano o GGB outorgou o troféu Pau de Sebo ao Deputado Jair Bolsonaro na condição de maior inimigo dos homossexuais, considerando que sua cruzada antigay estimula a prática de crimes homofóbicos.

Ao se questionar a presença da homofobia nos crimes contra homossexuais, o professor Luiz Mott contra argumenta: “quando se divulgam estatísticas de crimes contra mulheres, negros, índios não se questiona se foram ou não crimes motivados pelo ódio, sem falar na subnotificação dos “homocídios”. Nos crimes contra gays e travestis, mesmo quando há suspeita do envolvimento com drogas e prostituição, a vulnerabilidade dos homossexuais e a homofobia cultural e institucional justificam sua qualificação como crimes de ódio. É a homofobia que empurra as travestis para a prostituição e para a margens da sociedade. A certeza da impunidade e o estereótipo do gay como fraco, indefeso, estimulam a ação dos assassinos” (por Luiz Mott, Cláudio Almeida e Marcelo Cerqueira).





Imagem: Marcius Clapp

segunda-feira, 18 de abril de 2011

Eu quero VLT em Salvador

Salvador passará por um momento histórico de mobilidade urbana na av. Paralela quando, no próximo mês, o Governo do Estado da Bahia escolherá entre dois modelos de transporte urbano de massa: o VLT (Veículo Leve sobre Trilhos), que representa a modernidade e a eficiência, e o BRT, sigla em inglês criada para dar um ar diferente ao corredor de ônibus que ainda existe na cidade, que representa a manutenção de um modelo de transporte baseado em ônibus já ultrapassado e saturado.

O VLT é capaz de transportar até 750 passageiros por veículo de modo seguro, rápido (velocidade de 70km/h), confortável, utilizando energia limpa, com câmeras de segurança em todos os lugares - o que leva à menor probabilidade de assalto, conservando o verde da av. Paralela – com a instalação dos trilhos sobre a grama, com pontualidade - pois será mais automatizado, e integrado ao futuro metrô de Salvador.

Enquanto isso, o BRT transportaria somente 160 passageiros por ônibus, lento (até 30km/h), poluidor - necessita queimar milhares de litros de óleo diesel diariamente prejudicando o meio ambiente e elevando o calor em nossa cidade, e necessitaria reduzir o canteiro central da av. Paralela construindo com asfalto mais duas pistas. Sem falar na insegurança dos constantes assaltos a ônibus - gravíssimo problema que assusta quem utiliza o ônibus e que, certamente, será um fator contra a decisão da classe média de deixar o carro em casa e passar a utilizar o transporte de massa. Com o BRT, sistema patrocinado pelos empresários de ônibus, a cidade continuaria refém dos constantes aumentos do valor da passagem de ônibus e das interrupções das vias de acessos para protestos.

Centenas de cidades no mundo testaram e aprovaram o VLT, sobretudo as cidades européias e até mesmo no Nordeste do Brasil como Fortaleza, Juazeiro do Norte e Crato no Ceará, Recife e Maceió. São cidades que apostam no transporte público de qualidade para seus cidadãos.

O BRT, cada vez mais ultrapassado, ainda é utilizado em cidades de países subdesenvolvidos, como Bogotá, na Colômbia e Cidade do Cabo, na África do Sul. Para difundir o BRT o Sindicato dos Empresários de Ônibus de Salvador financiou a ida de vários jornalistas a Bogotá com tudo pago, isso demonstra o investimento que tem sido feito na mídia baiana pelo BRT.

A definição pelo VLT é apenas um começo para o estabelecimento de um novo modelo de transporte que alcançará as cidades de Salvador, Lauro de Freitas e Camaçari, enquanto que o BRT chegaria apenas ao aeroporto de Salvador. O investimento inicial no VLT é maior, mas o custo de manutenção mensal é menor – o que poderá tornar o valor da passagem mais barata. Os benefícios do VLT são infinitamente superiores ao BRT.

Participe deste movimento, faltam poucos dias, acesse o blog na internet, participe das mobilizações que serão organizadas, convide a sua família, os seus amigos, colegas de trabalho, vizinhos e desconhecidos. Procure o(a) seu(sua) vereador(a) e deputado(a), diga-lhe que você quer o VLT. Vamos fazer uma corrente do bem pelo VLT. Por fim, CLIQUE AQUI e assine o nosso abaixo-assinado.

segunda-feira, 11 de abril de 2011

Qual é a resposta?

O que é o ódio? Um sentimento, claro! Mas que espécie de sentimento? Trata-se, de acordo com o dicionário, de um sentimento de aversão intensa, comumente gerada por medo ou raiva. Interessante esta associação entre ódio e medo. Odiamos o que tememos. E o que nos leva a temer isto ou aquilo? Na maioria das vezes, tememos fenômenos ou seres que nos ameaçam por colocarem em cheque nossas convicções, especialmente, as mais íntimas e profundas convicções, ou seja, aquelas sobre as quais nos sustentamos. Alguns indivíduos, emocionalmente e intelectualmente despreparados para enfrentar a vida, um fenômeno em constante mutação, defendem tais convicções de maneira irascível a fim de evitar, a qualquer custo, sua desorientação ou mesmo perdição. Esta é a base de toda forma de intolerância religiosa, social, racial, sexual, entre outras.

A semana passada foi fértil em episódios gerados pelo ódio. Três se destacaram. O mais chocante, sem dúvida, foi o ataque de um franco-atirador a estudantes de uma escola municipal do Rio de Janeiro. Doze mortos, vários feridos e o espanto estampado na cara de todos nós. Por que tanto ódio? Qual a resposta? Menos chocante, porém, não menos espantoso foi o ataque homofóbico sofrido pelo jogador de vôlei Michel dos Santos, durante uma partida realizada na cidade mineira de Contagem entre sua equipe, a Vôlei Futuro, e a equipe do Cruzeiro, cuja torcida lotou o estádio para, além de ver o jogo, insultar o jogador devido a sua orientação sexual. “Nunca tinha passado por uma situação dessas. Foi a primeira vez que isso aconteceu. Não era só homem ou só torcedor de futebol que estava lá no jogo gritando e ofendendo. Eram mulheres, crianças, senhoras. Acontecem casos isolados, de alguma pessoa que não é instruída, que é uma pessoa meio que ignorante ou intolerante, e você releva. Mas isso não dava para passar e relevar, porque foi uma coisa bem forte”, declarou o atacante ao Jornal Nacional, que resolveu acionar a Justiça Desportiva. Em outra entrevista ele acrescentou: “Me senti bastante constrangido e indignado por essa situação toda... Queria ser avaliado como jogador e não pela minha opção sexual”. Por que tanto ódio? Qual a resposta?

Igualmente espantoso foi ver o deputado federal Jair Bolsonaro (PP-RJ) declarar no quadro O povo quer saber, do programa CQC, da Rede Bandeirantes, que não discutiria promiscuidade ao ser questionado pela cantora Preta Gil sobre a possibilidade de um filho seu se apaixonar por uma mulher negra. Segundo ele, seus filhos não “correm risco” de se apaixonar por negras porque foram “muito bem educados” e não viveram em ambientes onde predomina a “promiscuidade”, como, na visão do deputado, era o ambiente onde a cantora vive. Como se isso não bastasse, após Preta Gil ter declarado que processará o deputado, ele tentou justificar o injustificável alegando ter entendido mal a pergunta feita pela cantora. “O que eu entendi, na pergunta, foi ‘o que você faria se seu filho tivesse relacionamento com um gay’. Por isso respondi daquela maneira”, disse Bolsonaro ao portal G1. “Não sou racista. Apesar de não aprovar o comportamento da Preta Gil, não responderia daquela maneira”. Como bem lembrou a cantora Zélia Duncan em seu twitter, “Bolsanaro nega ser racista, mas admite ser homofóbico, pois racismo no Brasil é crime, homofobia não”. Já a Giovana Lizana, também no twitter, lembra que admitir ser homofóbico, mas não racista é o mesmo que dizer “incendiei porque pensei que era mendigo, não um índio”, referindo-se à declaração dos criminosos brasilienses que atearam fogo no líder indígena Pataxó Hã-Hã-Hãe, Galdino Jesus dos Santos, em abril de 1997. Por que tanto ódio? Qual a resposta? Como já escreveu e cantou o John Lennon, “o amor é a resposta e você sabe que isto é verdade”. Para quem não sabe o que é amor ou o que é amar, a única resposta possível é o ódio (por Sílvio Benevides).




Imagem: Marcos Sobral

Relaxa, Bolsonaro

Por que tanto medo dos homossexuais, deputado? Freud explica? Do que tem medo o deputado Jair Bolsonaro? Por que tanto ódio, tanta intolerância em relação aos homossexuais? Eu sei que muitos estudos psicanalíticos apontam que aquilo que as pessoas mais combatem é justamente o que existe de mais recôndito dentro delas. Exemplo: o moralista Edgar J. Hoover, que chefiou o FBI durante décadas, combatendo homossexuais e comunistas nos Estados Unidos, vestia-se de mulher, quando estava sozinho, no silêncio do seu quarto. Em breve, a história de Hoover, que será interpretado por Leonardo DiCaprio, chegará às telas do cinema. Assista ao filme, Bolsonaro, comendo uma pipoquinha.

Agora, para vocês, fãs do deputado, que já o elegeram por seis mandatos consecutivos, eu digo de uma vez por todas: acordem, o mundo mudou. Eu sei que muitos de vocês estão lotando o Twitter e disseminando mensagens de intolerância contra uma suposta “gaystapo”, numa alusão ao serviço secreto nazista de Hitler. Não tem graça. Os camisas pretas são vocês – e não as pessoas normais que repudiam a intolerância propagada pelo parlamentar mais ridículo do Brasil.

Nesta semana, uma coincidência colocou o deputado Bolsonaro em evidência justamente no dia em que se “comemoraram” 47 anos do golpe militar de 1964. Bolsonaro é uma das últimas viúvas da chamada “Revolução”. Um tempo em que militares musculosos marchavam em defesa da tradição, da família e da propriedade. E este é também o primeiro aniversário do golpe que tem Dilma, uma “terrorista”, na Presidência da República.

No mundo de hoje, o que se espera de Dilma? Que vire definitivamente a página mais vergonhosa da história brasileira. Primeiro, instituindo a Comissão da Verdade, tão temida e combatida pelos saudosistas de 1964. Depois, ela terá que alinhar o Brasil com o resto do mundo moderno, onde a agenda de direitos civis – que inclui temas como o casamento gay e a adoção de filhos por casais homossexuais – é discutida sem qualquer tipo de preconceito.

Por último, Bolsonaro, se cruzar com um gay por aí, relaxe. Puxe uma conversa. Quem sabe vocês não conseguem se entender? Seu eleitorado está morrendo. Já não se encontram mais tantas viúvas de 1964 por aí (por Leonardo Attuch para a revista Isto é – 2160).

Imagem: Quando o amor nasce é para todos, por Nuno Cunha

domingo, 3 de abril de 2011

Poema Falado: ESTRAMBOTE MELANCÓLICO

De acordo com o dicionário Houaiss, melancolia é um mal derivado do excesso de bile negra, que levava os indivíduos acometidos à lentidão, tristeza e prostração. Para a psiquiatria, trata-se de um estado mórbido caracterizado pelo abatimento mental e físico que pode ser manifestação de vários problemas psiquiátricos, tendendo, hoje, a ser considerado mais como uma das fases da psicose maníaco-depressiva. É, também, um estado afetivo caracterizado por profunda tristeza e desencanto geral ou, ainda, depressão. Por extensão de sentido, pode significar um sentimento de vaga e doce tristeza que compraz e favorece o devaneio e a meditação. Para a filosofia, porém, melancolia é pura e simplesmente humor negro. Em linguagem comum significa tristeza sem motivo. Para um escultor de palavras, entretanto, melancolia é o mesmo que poesia, algum dia traduzido assim por Carlos Drummond de Andrade: “Tenho saudade de mim mesmo, /saudade sob aparência de remorso, / de tanto que não fui, a sós, a esmo, / e de minha alta ausência em meu redor. // Tenho horror, tenho pena de mim mesmo / e tenho muitos outros sentimentos / violentos. Mas se esquivam no inventário, / e meu amor é triste como é vário, / e sendo vário é um só. Tenho carinho / por toda perda minha na corrente / que de mortos a vivos me carreia / e a mortos restitui o que era deles / mas em mim se guardava. A estrela-d'alva / penetra longamente seu espinho / (e cinco espinhos são) na minha mão”. Boa áudio-leitura! (por Sílvio Benevides)


*


Imagem: Paulo Madeira, Repouso.