segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

Se você tem fé, aquiete o coração; a vitória chegará (Bezerra de Menezes)

Deus nosso Pai, que sois todo poder e bondade, dai a força àqueles que passam pela provação, dai a luz àquele que procura a verdade, põe no coração do homem a compaixão e a caridade. Deus dai ao viajante a estrela guia, ao aflito a consolação, ao doente o repouso. Pai dai ao culpado o arrependimento, ao espírito a verdade, à criança o guia, ao órfão o pai. Senhor que vossa bondade se estenda sobre tudo que criastes. Piedade, Senhor, para aqueles que vos não conhecem, esperança para aqueles que sofrem. Que a vossa bondade permita aos Espíritos consoladores derramarem por toda a parte a paz, a esperança e a fé. Deus, um raio, uma faísca do vosso amor pode abrasar a terra; deixai-nos beber nas fontes dessa bondade fecunda e infinita e todas as lágrimas secarão, todas as dores se acalmarão. Um só coração, um só pensamento subirá até vós, como um grito de reconhecimento e amor. Como Moisés sobre a montanha, nós vos esperamos com os braços abertos (oh Bondade, oh Beleza, oh Perfeição) e queremos de alguma sorte merecer a vossa misericórdia. Deus dai-nos a força de ajudar o progresso de nossos semelhantes a fim de subirmos até vós; dai-nos a caridade pura, dai-nos a fé e a razão desprovida de vaidade e arrogância; dai-nos a simplicidade que fará das nossas almas o espelho onde se refletirá a Vossa Imagem (Prece de Cáritas psicografada na véspera do Natal de 1873 por Madame W. Krell).
*
Imagem: The spirit of Man - Solitude, por Angélica Tas.

sábado, 25 de dezembro de 2010

Então é Natal!

Ao entregar-se em plenitude, surge o Verbo como expressão absoluta do Mistério do Amor. O Mistério do Amor se chama Pai e sua expressão absoluta, Filho. Deus não tem nada a dar senão a si mesmo. Quando Deus se dá é Pai. O que surge desta doação é o Filho. No Filho a verdade, a bondade, a beleza e toda riqueza infinita de ser do Pai se projeta, expressa e concretiza. Aqui tudo é infinito e eterno. No Filho o Pai expressa também toda a riqueza, a beleza, abondade, a verdade finitas e temporais que podem ser criadas. O Pai se espelha em toda criação. Porque tudo foi criado no Filho, tudo também começa a espelhar o Filho [...] O projeto de Deus é, pois, fazer-se homem. Um dia no tempo, numa Virgem, se concretizou. Numa noite, numa gruta nasceu e hoje, no Natal, celebramos e, celebrando, atualizamos este evento de doçura humana e divina (por Leonardo Boff).

Agora o Menino veio.
As trevas se fizeram luz.
A noite tornou-se dia.
É o que significa o Natal: a festa da luz, da vidsa e do amor humanitário de nosso Deus.
Feliz Natal!
Feliz Navidad!
Joyeux Noel!
Merry Christmas!
Fröhliche Weihnachten!

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Imagem: Meu Presépio, por Sílvio Benevides.

sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

Poema do Menino Jesus

Num meio-dia de fim de Primavera
Tive um sonho como uma fotografia.
Vi Jesus Cristo descer à terra.
Veio pela encosta de um monte
Tornado outra vez menino,
A correr e a rolar-se pela erva
E a arrancar flores para as deitar fora
E a rir de modo a ouvir-se de longe.

Tinha fugido do céu.
Era nosso demais para fingir
De segunda pessoa da Trindade.
No céu tudo era falso, tudo em desacordo
Com flores e árvores e pedras.
No céu tinha que estar sempre sério
E de vez em quando de se tornar outra vez homem
E subir para a cruz, e estar sempre a morrer
Com uma coroa toda à roda de espinhos
E os pés espetados por um prego com cabeça,
E até com um trapo à roda da cintura
Como os pretos nas ilustrações.
Nem sequer o deixavam ter pai e mãe
Como as outras crianças.
O seu pai era duas pessoas -
Um velho chamado José, que era carpinteiro,
E que não era pai dele;
E o outro pai era uma pomba estúpida,
A única pomba feia do mundo
Porque nem era do mundo nem era pomba.
E a sua mãe não tinha amado antes de o ter.
Não era mulher: era uma mala
Em que ele tinha vindo do céu.
E queriam que ele, que só nascera da mãe,
E que nunca tivera pai para amar com respeito,
Pregasse a bondade e a justiça!

Um dia que Deus estava a dormir
E o Espírito Santo andava a voar,
Ele foi à caixa dos milagres e roubou três.
Com o primeiro fez que ninguém soubesse que ele tinha fugido.
Com o segundo criou-se eternamente humano e menino.
Com o terceiro criou um Cristo eternamente na cruz
E deixou-o pregado na cruz que há no céu
E serve de modelo às outras.
Depois fugiu para o Sol
E desceu no primeiro raio que apanhou.
Hoje vive na minha aldeia comigo.
É uma criança bonita de riso e natural.
Limpa o nariz ao braço direito,
Chapinha nas poças de água,
Colhe as flores e gosta delas e esquece-as.
Atira pedras aos burros,
Rouba a fruta dos pomares
E foge a chorar e a gritar dos cães.
E, porque sabe que elas não gostam
E que toda a gente acha graça,
Corre atrás das raparigas
Que vão em ranchos pelas estradas
Com as bilhas às cabeças
E levanta-lhes as saias.

A mim ensinou-me tudo.
Ensinou-me a olhar para as coisas.
Aponta-me todas as coisas que há nas flores.
Mostra-me como as pedras são engraçadas
Quando a gente as tem na mão
E olha devagar para elas.

Diz-me muito mal de Deus.
Diz que ele é um velho estúpido e doente,
Sempre a escarrar para o chão
E a dizer indecências.
A Virgem Maria leva as tardes da eternidade a fazer meia.
E o Espírito Santo coça-se com o bico
E empoleira-se nas cadeiras e suja-as.
Tudo no céu é estúpido como a Igreja Católica.
Diz-me que Deus não percebe nada
Das coisas que criou -
"Se é que ele as criou, do que duvido." -
"Ele diz por exemplo, que os seres cantam a sua glória,
Mas os seres não cantam nada.
Se cantassem seriam cantores.
Os seres existem e mais nada,
E por isso se chamam seres."
E depois, cansado de dizer mal de Deus,
O Menino Jesus adormece nos meus braços
E eu levo-o ao colo para casa.

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Ele mora comigo na minha casa a meio do outeiro.
Ele é a Eterna Criança, o deus que faltava.
Ele é o humano que é natural.
Ele é o divino que sorri e que brinca.
E por isso é que eu sei com toda a certeza
Que ele é o Menino Jesus verdadeiro.

E a criança tão humana que é divina
É esta minha quotidiana vida de poeta,
E é por que ele anda sempre comigo que eu sou poeta sempre.
E que o meu mínimo olhar
Me enche de sensação,
E o mais pequeno som, seja do que for,
Parece falar comigo.

A Criança Nova que habita onde vivo
Dá-me uma mão a mim
E outra a tudo que existe
E assim vamos os três pelo caminho que houver,
Saltando e cantando e rindo
E gozando o nosso segredo comum
Que é saber por toda a parte
Que não há mistério no mundo
E que tudo vale a pena.

A Criança Eterna acompanha-me sempre.
A direcção do meu olhar é o seu dedo apontado.
O meu ouvido atento alegremente a todos os sons
São as cócegas que ele me faz, brincando, nas orelhas.

Damo-nos tão bem um com o outro
Na companhia de tudo
Que nunca pensamos um no outro,
Mas vivemos juntos e dois
Com um acordo íntimo
Como a mão direita e a esquerda.

Ao anoitecer brincamos as cinco pedrinhas
No degrau da porta de casa,
Graves como convém a um deus e a um poeta,
E como se cada pedra
Fosse todo o universo
E fosse por isso um grande perigo para ela
Deixá-la cair no chão.

Depois eu conto-lhe histórias das coisas só dos homens
E ele sorri porque tudo é incrível.
Ri dos reis e dos que não são reis,
E tem pena de ouvir falar das guerras,
E dos comércios, e dos navios
Que ficam fumo no ar dos altos mares.
Porque ele sabe que tudo isso falta àquela verdade
Que uma flor tem ao florescer
E que anda com a luz do Sol
A variar os montes e os vales
E a fazer doer aos olhos dos muros caiados.

Depois ele adormece e eu deito-o.
Levo-o ao colo para dentro de casa
E deito-o, despindo-o lentamente
E como seguindo um ritual muito limpo
E todo materno até ele estar nu.

Ele dorme dentro da minha alma
E às vezes acorda de noite
E brinca com os meus sonhos.
Vira uns de pernas para o ar,
Põe uns em cima dos outros
E bate palmas sozinho
Sorrindo para o meu sono.

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Quando eu morrer, filhinho,
Seja eu a criança, o mais pequeno.
Pega-me tu ao colo
E leva-me para dentro da tua casa.
Despe o meu ser cansado e humano
E deita-me na tua cama.
E conta-me histórias, caso eu acorde,
Para eu tornar a adormecer.
E dá-me sonhos teus para eu brincar
Até que nasça qualquer dia
Que tu sabes qual é.

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Esta é a história do meu Menino Jesus.
Por que razão que se perceba
Não há-de ser ela mais verdadeira
Que tudo quanto os filósofos pensam
E tudo quanto as religiões ensinam ?

(por Fernando Pessoa na pessoa do Alberto Caeiro)
*
Imagem: Gesu Bambino (1663), por Carlo Dolci.

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Adeus não! À BIENTÔT!

Ensinar é, também, aprender. Aprendi com uma aluna que participa do programa Building Global Friendship da organização Children’s International Summer Villages (CISV), fundada pela psicoterapeuta Dóris Allen, que estabelecer laços afetivos nos ajuda a transpor barreiras e a derrubar os muros invisíveis da intolerância. Ela me relatou que, por meio da sua participação nos programas educacionais promovidos pela CISV, aprendeu, entre outras coisas, que os países não são meras entidades geopolíticas, conforme estudamos nas escolas formais, mas, sim, unidades afetivamente construídas. Hoje, quando ela observa, por exemplo, o mapa-múndi e localiza um país no qual já esteve, vê o rosto do amigo ou amigos que conquistou (sim, amizade é uma conquista). Assim, aquele espaço político-administrativo deixa de ser uma abstração e se transforma numa concretude cunhada pelo afeto.

Pensando nisso, cheguei à conclusão de que é justamente o afeto que me une ao Québec. Quando localizo no mapa o pedaço do mundo denominado de Québec enxergo não uma unidade político-administrativa fria como todas as outras, mas, sim, os belos rostos de duas quebequenses que atendem pelo nome de Christiane e Anne-Marie. Por causa delas o Québec deixou de ser um lugar distante, quase perdido na região norte do planeta. Agora, o Québec é um lugar próximo a Salvador, talvez tão próximo quanto Aracaju, Canudos, Rio de Janeiro, Belo Horizonte ou mesmo São Paulo. Os lugares são as pessoas. Nessa perspectiva, a noção de próximo e distante passa, necessariamente, pelo coração. Por isso, quando Christiane partiu, combinamos que não diríamos adeus, pois o tempo do adeus é longo e impreciso, adequado para nos referirmos às abstrações político-administrativas. Bientôt é mais apropriado para quem se uniu de bom grado por meio do afeto. Por isso eu digo à bientôt Québec (por Sílvio Benevides).
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Imagem: Flor de Lis, por João Cabral.

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

Politicamente correto

Bem, acredito que se tem realmente um exagero na questão do politicamente correto ultimamente e isso chega como uma atitude norte-americanizada, um jeito de assumir posturas que não condizem com a nossa cultura. O que escola e educadores devem fazer é mostrar o que é preconceito, falar sobre eles e educar, criando seres pensantes e críticos. Não vamos educar para transformar pessoas em “robozinhos”.

Isso de mudar versão de músicas e histórias apenas por mudar não faz sentido algum. O que vale é falar sobre problemas sociais e mostrar que eles existem e estão no nosso dia e que para se acabar com os problemas se deve conhecê-los e discutir sobre eles.

Vivemos em um mundo no qual a informação chega muito mais rápido do que se pode imaginar. Mas o que se fazer com tantas informações? Aceitamos? Acreditamos? Engolimos? Não seria melhor discutir, analisar e saber criticar? O politicamente correto também exagera, também erra. O que devemos é saber colocar na balança o que de fato prejudica e o que de fato é correto. Vamos aproveitar o que é bom e deixar de lado o resto. Histórias, músicas, teorias devem ser aceitas e analisadas pensando no momento em que foram criadas e nos seus objetivos. Algumas, de fato, deve-se questionar, outras, no entanto, não faz o mínimo sentido questionar e, modificar, muito menos.

Meu Cravo e minha Rosa vivem suas crises em todas as cirandas. Por que não aproveitar a música e falar de conflitos, agressividade e parar de se preocupar com o certo e o errado? É pensar em cantar algo que foi feito em uma outra época ou, para os incomodados, é apenas não cantar...Aff!!

Discriminar alguém por idade, cor, orientação sexual, raça, etc., ou menosprezar qualquer atividade profissional FOI, É e SERÁ preconceito. Gente, basta pensar antes de falar! Isso ajuda bastante. Quem não tem preconceitos levante a mão. Alguém levantou? Sendo assim, o politicamente correto tem seu lugar se soubermos por que o estamos aplicando. Desta maneira, ele sempre será bem vindo. Quanto ao preconceito...vamos aprendendo a lidar com ele até superá-lo! Mas, o que é preconceito? Sempre ouvimos falar nessa palavra, mais afinal de contas o que ela realmente significa?

O preconceito não passa de um conceito que criamos antes de saber o que aquilo realmente é. Por esse falso conceito muitas vezes maltratamos o próximo e nem pensamos nas conseqüências daquele ato. No mundo existem muitas formas de preconceitos, o mais comum, porém, originam-se no fato de a pessoa ser de uma etnia diferente, ou por ter uma religião diferente da nossa, por ter a cor da pele diferente, por ser de outra classe social, por ter orientação diferente, entre outros (por Gina Carla Reis).
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Imagem: O cravo e a rosa, por Felipe Camperlingo.

domingo, 5 de dezembro de 2010

Poema Falado: O Menino Jesus

Mais um Natal se aproxima. Mais uma vez votos de prosperidade são desejados aos corações de boa vontade. Entretanto, fico a pensar se pode haver, de fato, prosperidade em meio a tanta ignorância. Não me refiro à ignorância do saber, mas, sim, à ignorância de sabedoria. Explico. Ao se fazer carne e sangue, o Verbo nos ensinou que o amor é o único caminho. Amai-vos uns aos outros, esse foi o legado do Verbo. Mas será que tal legado é vivido por aqueles que se dizem cristãos? Se sim, por que, a despeito de toda a tecnologia e de tanto dinheiro (concentrado nas mãos de poucos é verdade), a fome é, ainda, um flagelo presente na história da humanidade? Arrisco dizer que o desamor nos leva a abandonar seres humanos a tão amarga sorte. O Poema Falado deste mês de dezembro, época em que os cristãos de todo o mundo comemoram o nascimento do Menino Jesus, o Verbo encarnado, propõe uma reflexão. De autoria da extraordinária Adélia Prado, o texto nos diz: “Sofri sozinha este insuportável, / quando me trouxeram o menino / que parecia dizer/ ‘me pega, diz que não sou órfão, / que tenho pai e mãe, / me fala que não sou um usurpador’. / Atracou-se comigo até dormir. / Mesmo rígida, / fui sua cruz mais branda”. Faço votos de que no ano que se aproxima ninguém se sinta um órfão ou um usurpador. Boa vídeo-leitura (por Sílvio Benevides).


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Imagem: This is África, por José Ferreira.