terça-feira, 14 de setembro de 2010

Falso Testimonio

No último dia 09 de setembro assisti na sala principal do Teatro Castro Alves (TCA) o espetáculo de dança Falso Testimonio, na abertura do III Festival Latino Americano de Teatro da Bahia (FILTE), que acontecerá até o próximo dia 19 de setembro. O espetáculo é uma produção da BoanDanz Action Company, uma companhia de dança fundada na Filadélfia (EUA) em 2005 pela coreógrafa cubana Marianela Boan.

De acordo com a sinopse do espetáculo, Falso Testimonio “apresenta uma maneira totalmente nova de integrar dança, vídeo e música ao vivo, combinando inteligência, graça, perfeição e um sofisticado uso da tecnologia para falar sobre o mundo computadorizado de hoje”. Trata-se, segundo a coreógrafa Marianela Boan, de uma apaixonada e poderosa obra que explora a vida na era “pós-tecnológica”, questionando “quais são os vínculos emocionais entre os humanos e a imagem” e a influência desta nas relações afetivas humanas.

Após o espetáculo, tive absoluta certeza que não apenas Deus está morto, conforme apregoou Nietzsche, mas, também, o autor, ou melhor, o Deus-Autor, como discorreu o Roland Barthes no seu conhecido texto “A Morte do Autor”. Disse ele: “sabemos agora que um texto não é feito de uma linha de palavras, libertando um sentido único, de certo modo teológico (que seria a “mensagem” do Autor-Deus), mas um espaço de dimensões múltiplas, onde se casam e se contestam escritas variadas, nenhuma das quais é original: o texto é um tecido de citações, saldas dos mil focos da cultura”. Para mim, espectador, foi outra a leitura que fiz do Falso Testimonio.

Sim, o espetáculo fala sobre sentimentos, mas não daqueles vinculados à imagem ou à tecnologia. Mas daqueles presos e encarcerados no fundo das almas e que, desesperados e inquietos, anseiam explodir. No decurso natural da vida o movimento é um ato que não pode ser detido, muito menos confinado em um armário qualquer. O mesmo ocorre com o desejo. Cedo ou tarde ele lateja e explode em fúria por ter sido encarcerado. O desejo é como um rio. Não se pode impedir que ele corra. No palco vimos duas mulheres encaixotadas que se batem e rebatem em busca de ar. Elas encontram uma saída, mas as forças repressivas as empurram de volta para caixa. Embora escondido, ainda assim, o desejo nos é visível. Ele está sempre ali até o instante da fúria, quando as duas bailarinas se debatem raivosas até rasgarem suas roupas, signo da repressão. Um espetáculo tenso e, também, denso que vale a pena ser visto. Mas prepare seu espírito, pois o texto da Marianela Boan é um discurso inacabado. Aqui não se trata de uma personagem em busca de um autor, mas, sim, de uma artista em busca de uma estética. Esta foi a leitura que fiz. Mas é claro que ela bem pode ser um falso testemunho (por Sílvio Benevides).
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Imagem: Falso Testimonio, por Paige Ozaroski.

2 comentários:

Papillon disse...

Caro amigo, Silvio.

É verdade que a ideia do espetáculo é mesmo ótima. Levar 3D ao palco é mesmo genial.

O inicio da apresentação chega a prender e encantar o público. Mas a ideia fica densa e muito cansativa com o exagero das repetições. Ficou chato!
O espetáculo que tem no maximo 35 minuto parece ter 2h tamanho o desconforto e impaciência que causa ao publico. As pessoas saíram do teatro com cara “ UfA , terminou!” ou UfA, não agüentava mais!!
O que, acredito, poderia ser bem diferente se não fosse o exagero de barulho e de repetição.

Sua leitura ou testemunho é muito boa sobre a ideia do espetáculo mas não transmite a inquietação vivida pelo público para a chegada do fim da apresentação. Eu diria a quem vai assistir o seguinte: se deseja chegar ao final que tenha muita paciência e se prepare pra uma tortura de barulhos. Pode ser interessante para uns e sem sentido para outros.
Infelizmente a apresentação gera um desconforto ao publico e alguns deixam o teatro antes do final.

Coccinelle disse...

Por que gera desconforto? Também vi o espetáculo e acho que o suposto desconforto gerado pode ter relação com o desejo reprimido de cada um que na platéia se encontrava. Concordo que o espetáculo poderia ser menor. Sim, há muitas repetições, mas isso não é desculpa para o UFA!