terça-feira, 27 de julho de 2010

Da série na sola do pé: MANAUS

Que maravilha de país é o nosso, onde é possível conhecer diversos mundos sem estar do lado de fora. Caso houvesse a possibilidade de se resumir o Brasil em uma palavra apenas, esta, sem dúvida, seria a palavra surpreendente. A cada passo que se dá nessa terra quase toda chã uma nova surpresa se delineia à nossa frente. Se o intento é conhecer o Brasil, faz-se necessário, antes de mais nada, navegar pelos seus desvãos, deixar para trás os manuais produzidos nos gabinetes para seguir adiante na sola do pé. E foi dessa maneira que meus pés aportaram em Manaus, capital do imenso Amazonas.

O que dizer sobre Manaus? Em primeiro lugar, o óbvio. Apesar do enorme calor que faz por aquelas paragens, a cidade é deveras interessante. Um tanto mal tratada, é verdade, porém não menos bela que as mais belas cidades brasileiras. Mesmo o descaso dos seus administradores, de modo algum, consegue ofuscar-lhe a beleza. E beleza é o que não falta em Manaus. Da exuberante floresta que a circunda a arquitetura art nouveau de edificações do seu centro histórico, passando, claro, pelos encantos dos seus diversos tipos físicos, notadamente marcados pelas mais variadas tonalidades indígenas, o que faz dos manauaras um povo de singular boniteza, comparável tão somente à magnitude dos rios Negro e Solimões, que mais parecem um imenso mar de águas doces. Sabores e delícias também não faltam por lá, das frutas amargas a caldeiradas suculentas, a culinária é espetacular. E como não falar daquela que talvez seja a sua pedra mais preciosa: o Teatro Amazonas. Nada menos do que simplesmente esplêndido! Jóia rara da cultura manauara que enriquece ainda mais a cultura de todos nós.
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Manaus é, sem dúvida, uma cidade sui generis. Caminhando por suas vias tão pacatas e, também, tão caóticas, percebe-se, sem grande esforço de nossa imaginação sociológica, que a capital amazonense é um grande espaço urbano onde se equilibram, com invejável desenvoltura, influências globalizantes de um lado e, de outro, as tradições culturais sobre as quais essa gente se firmou. Equilíbrio, nesse caso, não significa ausência de conflitos. Estes, de certo, existem aos borbotões, pois Manaus não é o Éden, mas, sim, Brasil. Assim sendo, traz consigo toda ordem de conflito que secularmente nos acompanha e envergonha. Entretanto, não se pode negar que a capital do Amazonas é o sonho modernista realizado. Os manauaras vivem no seu dia-a-dia toda a antropofagia cultural proposta pelos mentores do Modernismo brasileiro. Abrem-se para o mundo sem, no entanto, abrirem mão da sua identidade, da sua cultura, tão exuberante quanto o verde da Amazônia. Esta capacidade de absorver o mundo sem se deixar absorver por ele é a característica mais fascinante de Manaus e dos manauaras, um povo muito simpático, generoso, sorridente e maravilhosamente hospitaleiro. O Brasil precisa descobrir o Brasil e aprender com sua gente (por Sílvio Benevides).
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Imagem: Centro de Manaus, por Sílvio Benevides.

segunda-feira, 19 de julho de 2010

Somos nós idiotas?

O secretário-geral da FIFA, o senhor Jerome Valcke, declarou em recente entrevista que “falta tudo” no Brasil para que o país esteja em condições de sediar a Copa do Mundo de 2014, a exemplo de estádios, aeroportos, estradas e capacidade hoteleira. Ao que tudo indica essa declaração não agradou ao Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, pois durante o lançamento do edital do trem-bala Rio-São Paulo, ocorrido no dia 13/07, em Brasília, o chefe do Executivo nacional retrucou: “Terminou a Copa do Mundo na África do Sul agora e já começam a dizer: ‘cadê os aeroportos brasileiros, os estádios, cadê os corredores de trem brasileiros, cadê os metrôs brasileiros”, como se nós fossemos um bando de idiotas que não sabem fazer as coisas e definir as nossas prioridades”.

Bem, se somos ou não idiotas, não saberia dizer. Mas seria bom lembrar ao Filho do Brasil que faz uma década, pouco mais ou menos, que nós, soteropolitanos, estamos a esperar a implementação do nosso transporte de massa, carinhosamente apelidado de metrô. As obras do dito cujo tiveram início ainda na gestão do ex-prefeito Antônio Imbassahy. Arrastaram-se por todo o primeiro mandato do atual prefeito João Henrique e continuam a arrastar-se pelo segundo. Esta é uma novela que parece não ter fim. Do início das obras para cá ocorreram inúmeras paralisações, diversas denúncias de superfaturamento e várias revisões do projeto original, que deveria ter 13 km, mas parece que haverá somente 6 km.
Diante deste fato, penso que a população de Salvador não tem nenhum motivo para confiar que toda a infra-estrutura necessária à realização da Copa do Mundo ficará pronta até 2014, ou seja, daqui a quatro anos. Refiro-me não apenas ao metrô, mas, também, à extensão das vias públicas que garantam o bom funcionamento da cidade durante os jogos, à ampliação do aeroporto local, da rede hoteleira, entre tantas outras prioridades que há muito já deveriam ter sido implementadas na nossa urbe. Acho muito difícil acreditar que obras que não foram realizadas em muitas décadas possam ser feitas em apenas quatro anos. Sendo assim, vale perguntar: cadê, Presidente, nosso metrô? Como não acreditar que os administradores públicos dessa cidade e desse país não são, de fato, “um bando de idiotas que não sabem fazer as coisas e definir as nossas prioridades”? Não dá mais para engolir balelas soltas ao vento. Chega de cinismos e idiotices (por Sílvio Benevides).

segunda-feira, 12 de julho de 2010

Agora é o porvir

Terminou a Copa do Mundo da África do Sul. A Espanha consagrou-se campeã e o resto do mundo ficou a assistir a festa de “nuestros hermanos ibéricos” por vezes com inveja, por vezes com um certo ar de despeito. Fim de festa. Agora é hora de pensar no que estar por vir. E o que está por vir para nós brasileiros é a eleição para presidente da república, para senadores, deputados federais e estaduais e, também, governadores. As eleições de 2010 significam muito mais do que a simples escolha de candidatos. Nelas serão traçados os rumos do país e dos Estados para os próximos quatro anos. É preciso, portanto, tomar bastante cuidado na hora de escolher um candidato.

Por mais que uns e outros desinformados por aí digam que detestam política, que política é sinônimo de sujeira e corrupção de toda espécie, que político nenhum presta não devemos nos deixar contaminar por essas idéias ridículas. Se insistirmos em pensar assim, os maus políticos, aqueles sem ética, sem caráter, sem honra ou decência, e toda a corja que os apóia continuarão a se beneficiar. E muito! Por isso, é preciso se interessar, sim, pela política e, do mesmo modo, pelo processo eleitoral por meio do qual elegemos nossos representantes. Somente pela via política é que podemos transformar a realidade que nos cerca. E se essa política se realiza sob um regime democrático, podemos vislumbrar um mundo melhor para todos ou um mundo onde todos tenham, no mínimo, uma vida digna. Apesar de todas as crises que as sociedades democráticas contemporâneas têm enfrentado, a democracia continua sendo, até que se prove o contrário, a melhor maneira de se viver em comunidade. A alternativa a democracia é a guerra, o despotismo, a barbárie. Por isso precisamos defender a política, a democracia ou qualquer outro regime que vise o bem da coletividade.

Política é coisa séria e as decisões tomadas por nossos representantes nas diferentes instâncias do político afetam a vida de todos nós. Sendo assim, nas próximas eleições não devemos escolher um candidato a um cargo público do mesmo jeito que escolhemos um tênis, um cinto, um caderno, um abadá ou uma camisinha. O Palácio do Planalto, o Congresso Nacional, as assembléias estaduais e as governadorias são lugares destinados a pessoas sérias e comprometidas com o bem-estar da coletividade. Merda a gente despeja na latrina e depois puxa a descarga. De nada adianta agir de maneira irresponsável na hora de votar, elegendo candidatos espúrios e, depois, reclamar da política e dos políticos. Quem ajuda a eleger corrupto é cúmplice de todos os seus atos de corrupção. Não tem, portanto, moral alguma para reclamar ou se queixar. O Brasil está mudando, vivemos numa sociedade democrática na qual as informações circulam sem censura (ao menos oficial). Informemo-nos, pois. A eleição não se restringe tão somente a hora do voto. Ela é um processo contínuo que dura não alguns meses, mas quatro anos. Terminada a festa esportiva de 2010 é chegada a hora de pensar na política para garantirmos uma festa ainda melhor em 2014 (por Sílvio Benevides).
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Imagem: Charge política, por Gilmar.

Espanha campeã 2010

Como todos já sabem a seleção espanhola de futebol é a grande campeã da Copa do Mundo da África do Sul. Parabéns ESPANHA! Resultado bem merecido por dois motivos. Primeiro porque essa vitória é fruto de pesados investimentos feitos pelos espanhóis para incrementar o seu futebol. Segundo porque a Holanda, em diversos momentos da partida final, deixou de lado o futebol e partiu para a ignorância, deixando laranja qualquer espírito esportivo. A Espanha, por sua vez, jogou bonito em todos os sentidos e, por isso, mereceu ganhar. Pouco importa se perdeu quando podia perder, como disseram uns maiorais por aí nos seus comentários “brilhantes”. O que importa de verdade é que no final das contas a Espanha levou a taça de campeã para casa.

Mas a Copa do Mundo da África do Sul não entrou para os anais futebolísticos somente pelo fato de a Espanha ter se consagrada campeã após chegar pela primeira vez a uma final. Grande feito! Essa Copa entrou para a história do futebol mundial também pelo fato de um invertebrado ter desbancado todos os especialistas e comentaristas gabaritados, o polvo Paul. Este sim sabe das coisas. Pôs todo mundo no chinelo, de reis a buenos locutores ensimesmados, que mesmo ignorando as faixas desfraldadas pela torcida brasileira tiveram que fechar o bico. Um arraso esse polvo alemão! (por Sílvio Benevides)
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Imagem: Javier Floriano/AFP

segunda-feira, 5 de julho de 2010

Poema Falado: Pensamentos e Le patrimoine

Os movimentos juvenis urbanos, a exemplo do hip hop, também se constituem, em muitos casos, como uma manifestação político-social expressiva das novas gerações das periferias dos grandes centros urbanos do mundo. Através dos traços coloridos dos grafites como também das rimas e ritmos dançantes do rap, o hip hop, além de uma expressão artística, também possui um acentuado teor de denúncia, protesto e reivindicação de inclusão social, funcionando como auto-falantes de um universo paralelo. Sejam estes os guetos negros de Nova Iorque, os banlieues parisienses ou as periferias das grandes cidades latino-americanas ou africanas, este universo paralelo é marcado por uma realidade social que submete milhares de jovens ao desemprego, à violência, à discriminação por conta dos seus endereços e ao preconceito racial e/ou xenófobo. Mesmo se o considerarmos apenas como expressão de uma arte de rua, percebe-se no hip hop uma demonstração da capacidade de improviso que esses jovens possuem quando se trata de defender seus conceitos ideológicos e sua visão do mundo no qual vivem. Por essa razão o Poema Falado deste mês presta uma homenagem ao movimento hip hop por meio das músicas-poemas Pensamentos, do grupo de rap brasileiro Somos Nós a Justiça (SNJ), e Le Patrimoine, do rapper africano Didier Awadi. Tudo isso embalado pela música do grupo canadense Radio Radio e por imagens broto de grafites produzidos em vários muros espalhados pelo mundo. Boa Leitura (por Sílvio Benevides)!
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Imagem: Grafite Manauara, por Sílvio Benevides.