segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

A viagem nunca pensada pode ser uma grande surpresa!

Brasília, capital da República Federativa do Brasil, inaugurada aos 21 de abril de 1960, pelo então presidente Juscelino Kubitschek (JK). Brasília, sonho antigo do Brasil que em 2010 completará 50 anos de existência. Viva a Brasília!

Quando se ouve falar em Brasília, pensa-se logo na política brasileira, repleta de escândalos escabrosos e muita, muita sujeira. A cidade, então, fica estigmatizada a ponto de neutralizar nossa vontade em conhecê-la. O que há em Brasília para ver? O que há em Brasília para se fazer? Essas são perguntas freqüentes que costumam passar pela cabeça daqueles que pensam visitar a capital da República. Principalmente quando se mora em Salvador, cidade com inúmeros atrativos e com uma aura toda especial. Não tínhamos interesse em conhecer Brasília, pois fazíamos uma imagem negativa do que poderia ser a cidade planejada para ser a capital! Que surpresa boa encontramos!

É muito salutar aproveitar as oportunidades que surgem à nossa porta e foi isso que fizemos. Surgiu a oportunidade de conhecer Brasília e não a desperdiçamos. Queríamos viajar no período do carnaval e surgiu uma ótima promoção área para Brasília e não pensamos duas vezes. Combinamos e acertamos tudo. Passagens compradas e 20 dias para organizar a viagem.

Imaginando que Brasília era um pedaço de concreto no meio do nada, resolvemos organizar saídas do Distrito Federal (DF) e fazer pequenas viagens, a fim de conhecer outras cidades próximas à capital da República, onde poderíamos encontrar outros amigos e também nos aventurarmos por mares nunca dantes navegados. Assim, além de descobrir Brasília também conhecemos outras cidades: a surpreendente Anápolis, a pequena e aprazível Nerópolis, a doce e meiga Goiânia e a linda Pirenópolis, para onde não se deve levar jamais o Mastercard, pois lá com ele nada tem preço, uma vez que não é aceito em estabelecimento algum! Leve seu Visa e seja feliz. Conselho de amigos.

Mas a grande surpresa da viagem foi mesmo Brasília. Uma cidade completamente verde, mais verde que Salvador. O seu concreto é apenas visto nas lindas construções projetadas por Oscar Niemeyer. Ficamos de queixo caído. Brasília não é só concreto ou corrupção política. Nossa capital é também beleza, arte, natureza, esplendor, organização (às vezes nem parece Brasil), pujança e hospitalidade ímpar.

Os brasilienses que conhecemos foram hospitaleiros e nos receberam com muito carinho. Pode-se dizer que o brasiliense é um povo alegre e gentil. Extremamente gentil. O que faz uma cidade ser interessante são as pessoas que nela habitam. E nesse item Brasília é muito rica. Os brasilienses sabem receber um visitante tão bem quanto os soteropolitanos. Pensando bem, talvez recebam melhor, haja vista que o povo de Salvador, no geral, desconhece limites. Isso, no entanto, é outra história. Na visita que fizemos à capital do Brasil (nosso Brasil!) durante o carnaval, tivemos a sorte de conhecer pessoas magníficas e, por isso mesmo, inesquecíveis. Foram essas pessoas que nos deixaram com muita saudade de Brasília e uma vontade enorme de regressar.

O mais engraçado de tudo era que os brasilienses que encontramos não entendiam porque dois baianos fugiam do carnaval de Salvador, cidade onde eles gostariam de estar. E aproveitaram para fazer boas indicações de lugares que deveríamos conhecer em Brasília e regiões. É claro que eles já estão convidados para o carnaval 2011 e com direito a hospedagem e guias altamente qualificados e apaixonados por sua cidade. Será um enorme prazer retribuir tanta gentileza no melhor estilo baiano de ser.

Viajar é descolar-se, é descobrir-se. Descobrimos que o maior parque urbano do mundo, que supera até mesmo o Central Park de Nova York, fica localizado na asa sul do Plano Piloto da capital federal. É o Parque da Cidade de Brasília Sarah Kubitschek, popularmente conhecido como Parque da Cidade. Quem poderia imaginar? Pois é, o parque é belíssimo e ótimo para brincar, passear, exercitar-se e tudo mais que o uso saudável da imaginação permitir.

Aprendemos nessa viagem que falar de Brasília é falar de história e de responsabilidade política. E para conhecer um pouco da história da nossa capital, é fundamental uma visita ao Memorial JK. É incrível! Ah, e não pode deixar de fazer também a visita monitorada ao Congresso Nacional. Essa é de emocionar qualquer brasileiro. Imaginar que tudo do nosso país é resolvido nesse local, encheu-nos de uma forte e inexplicável emoção. E como bem disse a nossa competente e simpática guia, nós estávamos sentados na cadeira de alguém que vai nos representar através do nosso voto. É bom saber escolher. Urna não é latrina e o Congresso Nacional é um lugar de respeito e não um covil de facínoras. Pense bem nisto na hora de votar para presidente, senadores, deputados e governadores nas próximas eleições de outubro.

Outra visita que também deve ser feita é à Torre de TV, pois de lá é possível avistar todo Plano Piloto e o horizonte de Brasília, que parece não ter fim. E para incrementar nossa visita à capital, chegamos em um grande momento político e histórico de limpeza de governos corruptos. Isso mesmo! Na quinta-feira dia 11/02/2010, dia da nossa chegada, também foi a data que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) decretou a prisão preventiva do governador do Distrito Federal, José Roberto Arruda. O governador foi flagrado em um vídeo recebendo dinheiro de suposta propina no mês de novembro de 2009. Na ocasião, o advogado de Arruda havia dito que o dinheiro era para comprar panetones para pessoas carentes. Uma vergonha para nosso país e para o DF. E nesse mesmo dia vimos e ouvimos as manifestações dos brasilienses escritas em faixas, assim como, grupos organizados gritando: Arruda na Papuda! E à noite, o decreto foi aplicado. Ficamos orgulhosos do nosso país. E estávamos lá nesse dia!

A linda Brasília tem ao seu redor grandes cidades que não compartilham de sua beleza e isso nos fez pensar muito sobre a questão sócio-econômica do DF. Ou seja, Plano Piloto é para quem tem dinheiro. O alto custo de vida deixa isso claro, sobretudo, os preços dos aluguéis e dos imóveis. E, assim, Brasília vira Brasil com sua desigualdade social gritante vista, principalmente, nas chamadas cidades satélites. Na Ceilândia há "favelas" que chocam até mesmo aos olhos habituados a ver miséria no seu dia-a-dia, como os olhos dos soteropolitanos, por exemplo.

Não podemos deixar de agradecer ao nosso amigo-irmão Clóvis, cuja simpatia, generosidade e alegria em nos receber e nos apresentar de uma forma bem baiana a sua Brasília nos comoveu e encantou! Como já disse o Milton Nascimento, amigo é coisa pra se guardar do lado esquerdo do peito, e é exatamente lá que o Clóvis estará até o último dia de nossas existências. Agora, amigo, cá entre nós, vai caminhar ao menos duas vezes por semana no Parque da Cidade, porque lá, além de saúde, é certo encontrar os mais variados remates de tecidos franzidos. Palavra de amigos (por Gina Carla Reis e Sílvio Benevides).
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Imagem: Congresso Nacional, Brasília-DF, por Sílvio Benevides.

segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

Suor, cerveja e os velhos problemas

O carnaval é a festa da desordem. Sobre isso muito já foi escrito. Durante o reinado do Momo a única ordem é promover a desordem, é extravasar a alegria contida e esquecer os problemas. Acontece que os problemas não desaparecem durante o carnaval. Embora esquecidos, eles continuam no mesmo lugar, a espreitar-nos. Alguns problemas são potencializados durante o verão, em especial, no período do carnaval. Um desses problemas é o chamado turismo sexual, uma das vertentes de um problema ainda mais grave, o tráfico de seres humanos. Um outro, não menos grave, é a exploração sexual de crianças e adolescentes, cujos casos aumentam consideravelmente durante o verão, em especial nas capitais do Nordeste. Para que possamos refletir sobre o assunto e o avanço dessas práticas na nossa cidade, conhecida como “terra da felicidade” e famosa pela receptividade e sensualidade de seu povo, o Salvador na sola do pé reproduz dois textos (vide postagens abaixo). O primeiro é o da campanha da Secretaria Especial dos Direitos Humanos (SEDH) sobre a exploração sexual de meninos e meninas. O segundo, um artigo sobre o tráfico de mulheres de autoria do sociólogo Antônio Jonas Dias Filho, publicado originalmente no jornal Correio da Bahia de 27/10/2002. Oito anos se passaram desde a publicação do referido artigo, mas os problemas do turismo sexual, do tráfico de seres humanos, em especial, de mulheres, assim como o da exploração sexual infanto-juvenil estão longe de ser coisa do passado na terra do Senhor do Bonfim. Reflitamos, pois, já que a indústria do carnaval só pensa em faturar alto e o resto, se não prejudicar os seus lucros exorbitantes, que se dane. Ao menos é o que tudo indica (por Sílvio Benevides).
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Imagem: O carnaval de Salvador, por Mr.Tym.

No carnaval, diga NÃO à exploração sexual de crianças e adolescentes!

CAMPANHA NACIONAL DE ENFRENTAMENTO DA VIOLÊNCIA SEXUAL CONTRA CRIANÇAS E ADOLESCENTES NO CARNAVAL 2010

A Campanha do Carnaval é uma das estratégias articuladas e executadas em parceria entre o Governo, a sociedade civil e organizações e organismos internacionais para o enfrentamento da violência sexual contra crianças e adolescentes e a garantia dos seus direitos. A 5ª edição da Campanha é coordenada pela Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República - SEDH/PR e foi lançada na última segunda-feira (08), no Rio de Janeiro (RJ).

O objetivo é prevenir a violência sexual contra crianças e adolescentes e estimular as denúncias dos casos ao Disque Denúncia Nacional - Disque 100 ou no Conselho Tutelar mais próximo.

Este ano, a campanha tem como slogan “Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes é Crime. Denuncie! Procure o Conselho Tutelar de sua cidade ou disque 100”, e traz uma jovem vestida de pierrô. A lágrima, traço característico desse personagem, denota a dor e o sofrimento das crianças e adolescentes vítimas de abuso.

Catorze capitais e uma cidade fronteiriça receberão ações de mobilização: Rio de Janeiro (RS), Salvador (BA), Recife (PE), Fortaleza (CE), Manaus (AM), Belém (PA), São Paulo (SP), Vitória (ES), Corumbá (MS), Porto Alegre (RS), Brasília (DF), Florianópolis (SC), Porto Velho (RO), Belo Horizonte (MG) e Campo Grande (MS).

Com o apoio do Ministério do Turismo (MTur), por meio do programa Turismo Sustentável e Infância (TSI), a campanha chegará a mais 12 municípios: Limeira (SP), São Luís (MA) Campinas (SP), Olinda (PE), João Pessoa (PB), Ilhéus (BA), Macapá (AP) e às cidades que compõem a Baixada Santista: Santos, São Vicente, Guarujá, Praia Grande, Mongaguá e Cubatão.

Durante as folias de Carnaval serão distribuídas camisetas, abanadores, cartazes, adesivos, bandanas, fitas para amarrar no pulso, tatuagens temporárias, além de peças em inglês e espanhol para uso da Polícia Federal junto aos turistas estrangeiros.

A coordenadora do TSI, Elisabeth Bahia, do MTur, conta que o objetivo da campanha é sensibilizar a sociedade e estimular as denúncias. “Para os foliões, deixamos uma mensagem: neste carnaval, tome uma atitude legal, denuncie casos de abuso ou exploração sexual de crianças e adolescentes pelo Disque Denúncia Nacional (Disque 100) ou no Conselho Tutelar mais próximo”, complementa (Fonte: Secretaria Especial dos Direitos Humanos – SEDH).
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Imagem: Banner da campanha nacional de enfrentamento da violência sexual contra crianças e adolescentes no carnaval 2010, promovida pela Secretaria Especial dos Direitos Humanos (SEDH).

O tráfico internacional de mulheres

O deslocamento de turistas ao redor do mundo, em busca de aventuras sexuais, não é um fenômeno recente e nem tão pouco desconhecido das sociedades contemporâneas. Além disso, existem dados que comprovam que esta atividade ilegal é uma das que mais cresce no mundo ao ponto de se tornar um dos braços mais atuantes do tráfico internacional de seres humanos, de acordo com dados da ONU.

O turismo sexual se articula sob a forma de um circuito e movimenta viajantes internacionais por diversos lugares do mundo e em diversas épocas do ano, combinando ao mesmo tempo lazer e sexo. Essa circulação se dá principalmente entre os países ricos e os chamados emergentes e pobres. Os principais centros emissores são aqueles situados na Europa, com destaque para: Alemanha, Holanda, Suíça, Itália, Espanha e Portugal. Os principais centros receptores, hoje, são: República Dominicana, Brasil, Cuba, Gana, Senegal e Tailândia.

Para o Brasil, os países emissores de turistas sexuais são: Alemanha, Espanha e Itália. Eles se dirigem normalmente para os estados litorâneos, com destaque para: Rio de Janeiro, Bahia, Pernambuco, Ceará e Rio Grande do Norte. A época mais procurada por eles é a alta estação, que vai de novembro a março. Porém, durante o ano inteiro é comum encontrar estrangeiros, geralmente nos estados litorâneos, acompanhados de mulheres e adolescentes nativas.

A preferência desses turistas recai sobre as mulheres e jovens negras e mestiças - mulatas ou morenas. Eles escolhem ainda, àquelas que tenham entre 15 e 23 anos, de acordo com entidades que defendem os direitos das crianças e adolescentes e entidades feministas que se dedicam a estudar o problema, como é o caso do Cedeca e do Projeto Chame, em Salvador.

Não é muito difícil entender o porque dessa predileção dos viajantes que chegam ao Brasil, em busca de lazer e sexo. Basta analisarmos as propagandas sobre o turismo no Brasil, veiculadas em outros países. Nelas existem muitos estereótipos e associações entre a sensualidade das mulheres brasileiras, as paisagens naturais e as atrações culturais como o Carnaval, por exemplo. Apesar de não acreditarmos que exista intencionalidade das empresas responsáveis por essas propagandas, no sentido de disseminar

O turismo sexual, entendemos que faltam critérios mais rígidos para disciplinar a circulação de cartazes, folders, vídeos e textos sobre o turismo nacional pois essa omissão tem tido um efeito direto no aumento da chegada de turistas sexuais nas últimas duas décadas. A despeito disso, o próprio comércio do turismo sexual tem uma forte propaganda em toda a Europa, EUA, Japão e Austrália e nessas peças o Brasil é incluído como uma dos principais centros receptores.

Entendemos que a forma como o esse tipo de turismo se organizou no Brasil, ao longo das duas últimas décadas, acelerou a implantação de uma outra atividade ilegal que é justamente o tráfico de mulheres e adolescentes. Essa hipótese se confirma quando cruzamos informações oficiais - divulgadas em jornais e dados de pesquisas realizadas por organizações de Direitos Humanos sediadas no país.

De acordo com algumas dessas fontes, a situação da emigração ilegal feminina, para prostituição, tem aumentado muito nos últimos anos na Europa: entre 1997 e 1999, por exemplo, a maioria das mulheres brasileiras que estavam em situação ilegal em Portugal, trabalhava como prostituta e tinha documentos falsos e na Suíça, entidades de defesa da mulher afirmam que cerca de 40% das mulheres que trabalham como dançarinas em nights clubs são brasileiras em situação ilegal. O chamariz para atrair mulheres e adolescentes para viajar até esses locais são agências de casamento com estrangeiros, agências de emprego e convites dos próprios turistas, que muitas vezes são agenciadores disfarçados que vivem desse tipo de atividade em seus países. A construção da identidade brasileira no exterior, ancorada em ícones como samba, carnaval, mulatas e futebol, contribui decisivamente para que fenômenos como esses, encontrem aqui um lugar privilegiado, tanto para visitação de turistas sedentos por viverem aventuras sexuais, quanto para atuação de agenciadores internacionais, que vêem nas brasileiras produtos de fácil e rentável aceitação no mercado internacional do sexo (por Antonio Jonas Dias Filho).
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Imagem: Desenho de Mário Brito (Marú) para campanha do Centro Humanitário de Apoio à Mulher (CHAME) de combate ao turismo sexual em Salvador.

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

Sedição e vida privada

É comum ouvir estudantes dizerem, reproduzindo as desinformações proferidas pelas autoridades do senso comum, que os brasileiros e, em especial, os baianos, são um povo muito pacífico, sem disposição para travar embates revolucionários. Basta darmos uma rápida olhadinha nas páginas da história para percebermos que esse argumento não se sustenta. As histórias do Brasil e da Bahia estão repletas de episódios de pretensões revolucionárias resultantes do inconformismo da população com a ordem estabelecida. Sobre isso fala a nota seguinte: “Entre os anos de 1789 e 1817 as autoridades de Lisboa viram-se diante de problemas sem precedentes. De várias regiões de sua colônia americana chegavam notícias de desafeição ao Trono, o que era algo muito grave. A preocupante novidade residia no fato de que o objeto das manifestações de desagrado, freqüentes desde os primeiros séculos da colonização, deslocava-se, nitidamente, de aspectos particulares de ações de governo para o plano mais geral da organização do Estado [...] O novo que desponta é a sedição [motim, agitação], entendendo-se por esta, neste final de século XVIII, a ação organizada visando a revolução. A sedição é o conjunto das práticas de natureza subversiva que, referidas à revolução, anunciam-na enquanto possibilidade, mesmo quando se concretizam apenas no simplesmente fazê-lo. A sedição é, então, a revolução desejada, o futuro anunciado, a política do futuro no presente. É disso que advém o seu papel corrosivo, muito mais perigoso do que os violentos motins e revoltas, pois estes não subvertem os fundamentos da ordem, antes busca restaurá-los […] Rigorosamente, apenas os eventos de Minas Gerais (Inconfidência Mineira, 1789), Bahia (Conjuração dos Alfaiates, 1798) e Pernambuco (Revolução Pernambucana, 1817) configuram sedições, na medida em que nesses eventos se tratava de deliberada e organizada vontade de subverter a ordem pública e os padrões de organização de Estado” (por István Jancsó).
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Imagem: Julgamento de Felipe dos Santos, por Antônio Parreiras.

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

Iemanjá: senhora e rainha do mar

Na tradição do candomblé, Iemanjá é a mãe suprema, pois de seu ventre nasceram todos os orixás. De acordo com Pierre Verger (Orixás. São Paulo: Corrupio, 1981), “Iemanjá, é o orixá dos Egbá, uma nação iorubá estabelecida outrora na região entre Ifé e Ibadan, onde existe ainda o rio Yemanjá. As guerras entre nações iorubás levaram os Egbá a emigrar na direção oeste, para Abeokuta, no início do século XIX. Não lhes foi possível levar o rio, mas, transportaram consigo os objetos sagrados, suportes do axé da divindade, e o rio Ogun, que atravessa a região, tornou-se, a partir de então, a nova morada de Iemanjá. Este rio Ogun não deve, entretanto, ser confundido com Ogun, o orixá do ferro e dos ferreiros”. No Brasil, o culto a Iemanjá voltou-se para as águas salgadas. Aqui, seus fiéis voltam-se, preferencialmente, para os mares quando desejam dirigir pedidos à grande mãe. E Iemanjá jamais nega um pedido de quem o faz com o coração limpo, como já demonstrou o Dorival Caymmi quando escreveu: “Eu mandei um bilhete pra ela pedindo para ela me ajudar. Ela, então, me respondeu que eu tivesse paciência de esperar. O presente que eu mandei pra ela de cravos e rosas vingou”. Como se pode perceber o segredo é ter paciência de esperar para que o presente vingue. E ele sempre vinga.

Excepcionalmente, o Poema Falado de fevereiro está a ser publicado não no primeiro domingo do mês, mas, sim, na primeira segunda-feira, pois amanhã será o grande dia, o dia de Iemanjá. Para homenageá-la, o poema “Canto de Iemanjá”, do Vinícius de Moraes: “Iemanjá, lemanjá. lemanjá é dona Janaína que vem. Iemanjá, Iemanjá. lemanjá é muita tristeza que vem. Vem do luar no céu. Vem do luar no mar coberto de flor, meu bem, de Iemanjá. De lemanjá a cantar o amor e a se mirar na lua triste no céu, meu bem, triste no mar. Se você quiser amar, se você quiser amor, vem comigo a Salvador para ouvir lemanjá, a cantar, na maré que vai e na maré que vem. Do fim, mais do fim, do mar. Bem mais além. Bem mais além do que o fim do mar. Bem mais além”. Vale a pena conferir o vídeo abaixo, nosso presente para Iemanjá, senhora e rainha do mar. Louvemos, então, Iemanjá! Odóiyá! (por Sílvio Benevides, Coccinelle e Papillon).


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Imagem: Presente para Iemanjá na Praia do Rio Vermelho (Salvador-BA), por Fabio Rodrigues Pozzebom.