segunda-feira, 25 de maio de 2009

Quer andar de trem “véio”, amor? Então venha!

A nota abaixo foi publicada na revista Exame (Edição 942 – 15/05/2009). Qualquer semelhança será mera coincidência?

As locomotivas viraram sucataEste é mais um dos exemplos gritantes de desperdício de dinheiro público. Estão encaixotadas num depósito da antiga Rede Ferroviária Federal, em Campinas, 68 locomotivas importadas da França em 1976. É isso mesmo: há mais de 30 anos, esses trens foram comprados e nunca foram montados. Eles faziam parte do Plano de Eletrificação da Fepasa, ferrovia paulista que depois foi incorporada à rede nacional. Na época, a crise do petróleo impulsionou a busca de energias alternativas para a movimentação de cargas. E, com o baixo custo da energia elétrica nos anos 1970, surgiu a ideia de eletrificar o trecho ferroviário que ligava Ribeirão Preto, Campinas e Santos. O plano não saiu do papel, mas o dinheiro para implantá-lo sim. Foram gastos 500 milhões de dólares na aquisição das locomotivas e da infraestrutura das subestações elétricas. Hoje, mais de três décadas após o malfadado plano, as máquinas praticamente viraram sucata. As 68 locomotivas são parte do inventário da Rede Ferroviária Federal — extinta após a privatização — e serão transferidas para o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transporte. O órgão será responsável por dar destino às máquinas francesas — provavelmente um ferro-velho (por Fabiane Stefano).

Não sei não, mas penso que o famoso metrô de Salvador está a percorrer esses mesmos trilhos. Tudo nos leva a crer nessa premissa. Obras constantemente embargadas e paralisadas por suspeita de superfaturamento e irregularidades no repasse de verbas; trabalhos que se arrastam ad infinitum sem nenhuma perspectiva de conclusão e se forem concluídos não terão cumprido sequer a metade do que foi inicialmente planejado, previsto, orçado e prometido. Enquanto isso os trens já aportaram na cidade e estão em algum galpão a caminho de virarem sucata. Como já disse o Caetano Veloso, já citado em outro post sobre o mesmo tema, “aqui tudo parece que é ainda construção e já é ruína”. Mas tudo bem! Estamos em Salvador e como todos sabem Salvador é uma festa! Uma cidade única com uma única alegria! Que beleza, que maravilha! Quer andar de trem “véio”, amor? Então venha! (por Sílvio Benevides)
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Foto: Aristeu Chagas/AGECOM

segunda-feira, 18 de maio de 2009

Coisas da Política – O Brasil e seu futuro

A despeito dos grandes pensadores brasileiros que atuam e atuaram nas diversas áreas do conhecimento e das artes nacionais, o Brasil ainda vive sob uma forte e persistente dependência intelectual. A academia brasileira, em geral, e a baiana, em particular, continua a repetir idéias e teorias francesas, inglesas, alemãs e estadunidenses como se os pensadores desses países fossem o único norte possível do pensamento humano (isso também ocorre com as artes, embora em menor grau). Alguns intelectuais brasileiros chegam até a sugerir para seus orientandos uma escala de hierarquização intelectual, na qual os autores mais importantes (sempre os franceses, ingleses, alemães e estadunidenses) devem ser o referencial teórico principal e, por isso mesmo, os obrigatoriamente citados. Agindo dessa maneira, acabam por transformar a academia não em um espaço onde se deve estimular o desenvolvimento de um pensamento crítico e autônomo, mas em um lugar onde papagaios são bem adestrados. O texto abaixo, de autoria do Mauro Santayana, é uma reflexão bastante lúcida sobre o Brasil e o seu papel no mundo contemporâneo. Para nos tornarmos “gigantes pela própria natureza”, como apregoa o nosso hino nacional, precisamos, antes de tudo, conquistar nossa independência mental e intelectual, “expressão maior da soberania de um povo”. Não podemos ficar ad infinitum reproduzindo esquemas teóricos que não refletem nossa realidade. Precisamos erigir uma teoria (ou teorias) genuinamente brasileira, que reflita o nosso jeito de ser e de entender o mundo, afinal, interpretar o mundo a partir do lugar que ocupamos é o que define a inteligência de uma gente. Estou farto de ouvir depreciações insanas ou ufanismos tolos sobre o Brasil. Se nós fomos capazes de conquistar nossa independência político-administrativa no século XIX, podemos perfeitamente conquistar nossa independência intelectual no século XXI. Como escreveu o Milton Nascimento “ficar de frente para o mar, de costas pro Brasil não vai fazer desse lugar um bom país”. Está mais do que na hora de nossas artistas, intelectuais e políticos perceberem isso. Abaixo a papagaiada! (por Sílvio Benevides).

Eis o texto do Mauro Santayana:

No ‘Ensaio para uma teoria do Brasil’, publicado em 1966 – e agora reproduzido em livro (Comunidade brasileira e outros ensaios, Editora da Fundação Alexandre de Gusmão, 2009), o filósofo Agostinho da Silva fez correção dialética à ideia de que o Brasil é o país do futuro. O pensador português, que aqui viveu muitos anos, mostra que a profecia antiga partia da suposição de que esse futuro seria atingir os módulos de civilização dos países ricos e centrais. Agostinho pensava o contrário. Já então, ele entendia que a civilização europeia, com sua projeção atlântica, entrara em decadência. O Brasil é, sim, o país do futuro, mas do futuro que a sua sociedade criará, com liberdade, tolerância e fraternidade.

“O que nos interessa, agora, é realmente o problema do Brasil e da sua capacidade de liderar o futuro humano, quando se desembaraçar de tudo quanto lhe foi inútil na educação europeia e exercer, com o esplendor e a vigorosa força de criação que pode demonstrar, as suas capacidades de simpatia humana, de imaginação artística, de sincretismo religioso, de calma aceitação do destino, da inteligência psicológica, de ironia, de apetência de viver, de sentido da contemplação e do tempo” – escreveu há 43 anos. Mesmo sob o látego do golpe militar, essas qualidades plurais do povo brasileiro eram evidentes. Esperava-se – e Agostinho também – que a arbitrariedade seria passageira, e o país retornaria logo à normalidade. Não poderia imaginar que, ao durar tanto, a ditadura deixaria sequelas terríveis na alma nacional.

Embora com todas as dificuldades que enfrentamos, o Brasil parece voltar a ser o país do futuro, não o futuro que então, e aqui, se imaginava. O texto de Agostinho é mais atual do que antes. Nós nos desviamos de nosso destino quando deixamos de inventá-lo. O culto à Europa e aos Estados Unidos, que teve o seu momento mais caricatural na passagem do século 19 para o 20, e se exacerbou grotescamente com o neoliberalismo, vem resistindo à lógica. Passamos a importar todos os modelos de fora, dos automóveis de luxo aos processos de administração pública, neles incluídas as leis, do sistema universitário às crises bancárias, da euforia dos cartões de crédito ao consumo de drogas.

Estamos diante da grande oportunidade de encontrar caminho próprio. O conceito do Brasil cresce no mundo, talvez porque seja, no imaginário da inteligência, o terreno – físico e espiritual – destinado a nova revolução histórica. É certo que, para isso, ele está sendo obrigado a fortalecer sua economia. Mas há, além do crafty power, com que a Newsweek o qualificou em matéria de capa, outras condições alentadoras. O Brasil, com sua biodiversidade, é o mais importante espaço para as pesquisas que contenham o aquecimento global e permitam também o usufruto da natureza sem lhe causar dano. Para isso, os transgênicos devem ser contidos a tempo. A Comissão Técnica de Bio-Segurança, ao permiti-los, está na contramão da lucidez.

A expressão maior da soberania de um povo é a independência mental. Não podemos, a pretexto de que já se inventou a roda, deixar de buscar outros meios de deslocamento. Somos chamados a ousar, se queremos aproveitar a oportunidade histórica. Ousar na reinvenção do Estado, nas pesquisas científicas e na criação de novos modos de convivência social, que sejam solidários e dinâmicos. Chegou o momento de romper com esse modelo de civilização que já se esgotou na História. Os países que sofreram a opressão do sistema, se souberem unir-se, poderão mudar o mundo. Nossa diplomacia, ao respeitar a autodeterminação dos outros, conquista amigos e não causa ressentimentos. A Espanha, orgulhosa de seu passado, tem sido muito arrogante, tratando com desprezo não só os viajantes da América Latina como os governantes hispano-americanos, como foi o caso de Duhalde, da Argentina, e Chávez, da Venezuela. Hoje, se esfalfa, buscando o apoio de nosso continente para ter assento no G-20, embora sem credenciais econômicas para tanto.
O passado é uma referência, mas não pode ser fardo a ser arrastado na escalada do tempo. Apesar do negativismo de alguns, o Brasil está em seu grande momento, e não pode perdê-lo. Daí a importância da reflexão de Agostinho da Silva: para fazer o futuro, devemos inventá-lo, com a alegria, o espírito universal de solidariedade, a inteligência criadora e a necessária consciência de que todos os brasileiros têm direito aos mesmos benefícios da civilização (por Mauro Santayana).
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Imagem: Mapa do Brasil

segunda-feira, 11 de maio de 2009

Ó têmpora! Ó mores!

Na última terça-feira 05 de maio Salvador parou. O intenso temporal que desabou sobre a cidade derrubou árvores, abriu buracos, botou abaixo morros e casas e fez transbordar canais, rios e diques que alagaram ruas e avenidas potencializando o caos do já caótico trânsito da nossa feliz urbe. O saldo de tudo isso: oito pessoas mortas. Duas delas afogadas e seis soterradas. Não vou falar dos prejuízos econômicos porque esses, por maiores que sejam, podem ser revertidos. É verdade que na maioria dos casos a duras penas. A despeito das dificuldades, há uma possibilidade, ainda que remota. O mesmo não pode ser dito em relação às vidas que se foram para sempre.
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A quem cabe a culpa de tudo isso? A São Pedro, diriam os homens cínicos que se acham capazes de governar nossa cidade, afinal, choveu em um dia o previsto para chover em um mês inteiro, ou quase isso. Acontece que as chuvas são um fenômeno natural. Elas chovem e choverão quer nós queiramos ou não. Culpá-las pelo caos que se transformou Salvador na semana passada seria o mesmo que culpar o galo pelo término da noite. O fato é que estamos a pagar o preço por termos eleito políticos ineptos que concebem a política tão somente como algo imediatista.
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Como já comentei na postagem Sobreviver é cuidar do porvir a política que se faz no presente deve estar voltada para o futuro. Essa idéia é da filósofa alemã Hannah Arendt, mais uma vez citada nesse blog. Segundo ela, “um espaço público não pode ser construído apenas para uma geração e planejado somente para os que estão vivos”, ou seja, planejado apenas para atender às necessidades presentes. Não estou afirmando que o presente deva ser ignorado. Não é isso! Mas o presente deve ser construído e planejado visando o futuro. Só dessa maneira se pode avançar.
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O que aconteceu em Salvador na última terça-feira ilustra bem essa questão. O caos da nossa cidade não foi provocado pelas chuvas. Na verdade, as chuvas apenas revelaram o caos no qual há muito tempo os soteropolitanos estão submersos. As autoridades municipal e estadual passadas e presentes pouco ou nada fizeram para que o caos do dia 05/05 não tivesse acontecido. Refiro-me, principalmente, a uma política pública habitacional que não privilegie somente os empreendimentos de luxo, mas, sobretudo, empreendimentos populares que ofereçam segurança àqueles que se arriscam em morar a beira de precipícios (assim também se trabalha em prol da contenção de encostas); a uma política pública de preservação ambiental (assim também se previne temporais intensos e seus efeitos nefastos); a uma política pública educacional que conscientize a população da importância de não se jogar lixo nas ruas, encostas, canais, rios, etc. (assim também se previne o entupimento das vias por onde as águas da chuva devem escoar), entre tantas outras iniciativas. Isso é trabalhar no presente visando o futuro.
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O que se deve perguntar é o seguinte: quais providências as autoridades municipal e estadual estão tomando para que no próximo ano essas tragédias não se repitam? Creio que pouco, muito pouco, a julgar pela declaração do presidente da Câmara Municipal, vereador Alan Sanches (PMDB), feita “na manhã de domingo, dia 10, na Catedral Basílica, durante a secular celebração ao santo protetor dos soteropolitanos”, segundo informou a Assessoria de Comunicação da Câmara de Vereadores. Para o vereador, só nos resta apelar para o padroeiro da cidade, São Francisco Xavier. Em suas palavras, “a sociedade conclama mais vez para que o padroeiro de Salvador e da Câmara, São Francisco Xavier, interceda neste momento difícil vivido por nossa cidade”. Então é isso? Devemos esperar que São Francisco Xavier interceda por nós? E quanto ao Ministro Gedel Vieira Lima? Acaso não é ele o homem das obras da integração nacional?
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Já o Governo Estadual e a Prefeitura de Salvador estão fazendo sua parte. Como se pode ver nas campanhas publicitárias de ambas as instâncias governamentais, assim como o Ministro Gedel Vieira Lima, nossa autoridades executivas estão a obrar muito, tanto na capital quanto em todo o Estado da Bahia. Estão a obrar em todo lugar. Talvez seja por isso que estejamos em tão boa situação. Sugiro que nossas autoridades parem de obrar na nossa cidade, no nosso Estado e no nosso país e passem a governar. Governar o presente para construir um futuro menos caótico na pior das hipóteses (por Sílvio Benevides).
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Imagens: Márcio Farani, Arestides Baptista (Ag. A TARDE) e Fernando Vivas (Ag. A TARDE)

segunda-feira, 4 de maio de 2009

Vitória Tricampeão!

Existe uma diferença entre ser vitorioso e ser derrotado. Os derrotados são aqueles que vivem do passado porque têm apenas o passado para seguir e cultivar. Talvez por isso não saibam perder, já que cada derrota lhes traz a certeza de que o futuro não existe para eles. No último domingo o primeiro e único Esporte Clube Vitória consagrou-se tricampeão baiano superando todos os obstáculos, de chuva forte a mau agouro. Campeão absoluto do novo milênio (seis taças em sete campeonatos estaduais), o Vitória é um time vitorioso porque vitoriosos são aqueles que vivem de glórias futuras, pois o futuro lhes espera de braços abertos (por Sílvio Benevides).

Vitória busca empate contra o Bahia e conquista o tri

O Vitória fez festa. Após uma partida suada, o time rubro-negro de Salvador comemorou o tricampeonato baiano mesmo com um empate por 2 a 2 no clássico Ba-Vi com o arquirrival Bahia. Em um jogo de superação, o atacante Neto Baiano e o meia Ramón foram os heróis deste domingo, marcando os gols do título para o Leão no Barradão.

Como teve melhor campanha ao longo da primeira fase e venceu a partida de ida por 2 a 1 no Estádio Pituaçu no último domingo, o time comandado por Paulo César Carpegiani tinha o direito de perder por até um gol de diferença para ainda assim renovar o título estadual. No entanto, o Bahia virou o intervalo como campeão com uma vitória parcial por 2 a 0, com gols de Reinaldo Alagoano e Ávine. Até que Neto Baiano, então apático no jogo, resolveu aparecer e marcar aos 19 minutos do segundo tempo. Por fim, o veterano Ramon, aos 43, encerrou o Baianão cobrando pênalti e confirmou o tri do Vitória.

Neto Baiano, além de ver o clube se sagrar tricampeão, conquista o prêmio de maior goleador do Campeonato Baiano. O atacante marcou 18 gols, com muita sobra para o segundo artilheiro da competição: Robert, que fez 13 a serviço do Atlético de Alagoinhas. Com a conquista deste domingo, o Vitória – que iniciou o ano treinado por Vagner Mancini, hoje no Santos – mantém a hegemonia estadual. Com esta taça, são seis nos últimos sete Campeonatos Baianos – apenas o Colo Colo de Ilhéus impediu em 2006 uma soberania ainda maior. Já o Bahia aumenta o jejum, uma vez que não vence o torneio desde 2001 (Fonte: Gazeta Press).
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Foto: Agência Estado